Pesquisar este blog

quinta-feira, setembro 30, 2010


Pérolas...

“...Fabiano as pessoas sabem quando lêem um texto assim. Por debaixo daquele lixo todo, existe vida cara, existe vida pulsando.”

Magalhães.


quarta-feira, setembro 29, 2010


Bolinha de sangue

Quando a vejo
Pálida com olheiras negras
Sorria naturalmente
-Ei você tá bem?
-Tudo bem, já resolvi o problema
-Sei, que problema?
-Uma maldita criança achou que iria nascer, mas já era. Tua porra forte.
Engoli seco alguma coisa
Era tudo tão natural
Já tinha feito outras vezes
Como uma máquina de abortar automática
Sem drama
Consciência com asas
Limpo e rápido - disse
Um remédio e tudo virava sangue no vaso
A descarga era o adeus final
Não me impressiono, já vi o filme
Tomávamos a cerveja enquanto falava assim
Dei conta de minha inocência
Não protestei, chorei ou disse algo
Tomei a cerveja em um gole
Brindamos ao sangue depois
O que assombra é o desassombro
Mudamos de assunto
Mas algo ficava em silencio
Um dente cravado em algum lugar
Era minha alma presa no abismo
Nas bolhas de sangue sem alma
Em um nada que sonhava possibilidades
Um cinismo a beira da crueldade
O pesadelo em forma de realidade
Aquilo durou um pouco
Ela me cansou
Fui embora
Dirigindo devagar
Chega.

Luís Fabiano.

Tiro de amor

Minha afinidade com armas é irrelevante. Nunca dei atenção. Mas por fatalidade, depois comecei a trabalhar, encontrei algumas. Tive diversos empregos. Alguns patrões portavam armamentos, e faziam questão de mostrar. Como uma extensão peniana. Estamos sempre em busca de poder barato. Alguns eu achava ridículo.
Diziam: olha só isso? Isso mata facilmente, faz um buraco considerável...e outras tolices .
Aprendi a manejá-las no quartel. Onde fui armeiro. Uma função interessante. Aprendi montagem e desmontagem de vários tipos de armas. Calibres leves a canhões. Isso era feito para manutenção preventiva, lubrificação .Eu gostava. Principalmente depois do horário do meio dia. Eu e meus colegas, saiamos para almoçar fora. A comida dentro do aquartelamento era horrível. Nosso almoço fora, era com cervejas. Muito bom. Eu voltava meio alto, e minha tarde de trabalho era muito aprazível.
As partes das armas pareciam quebra cabeças. Eu nunca errei a montagem e nunca faltaram peças. Era uma diversão, com direito a tiro de festim. Apontávamos as armas uns para outros, embora fosse proibido. Puxávamos o gatilho.
E agora isso ?Era patético.
Quando aquela arma saiu da gaveta durante o sexo, sabia que não viria boa coisa. Era um belo quarenta e quatro niquelado. O cano maior que meu pau. Ela sorria, com aquela proposta que parecia muito perigosa embora interessante:
-É fácil, tu sabes que eu sou” espaçosa”... coloca uma camisinha no cano e enfia em mim. Então tu engatilha...e... fica fazendo o movimento, mas sem apertar o gatilho tá?
Será que ela achou que eu fosse apertar? Bem...
-Mas Fátima, tu não acha meio arriscado, não?
-Não. Vai ser uma delicia, eu quero, e tu terás uma boa historia pra contar. Afinal quem trepa com um cano de um revolver?
-Sim. Poderá ser a ultima historia né? Porque se errar, a merda disparara no teu rabo, vai última vez de muitas coisas.
-Essa é a ideia, adrenalina, loucura, prazer, seja criativo...
-Mas se isso disparar, isso vai sair no teu crânio.
Pelada na cama, com aquela arma considerável. Era alguma coisa a se pensar. Fátima era maluca o suficiente para querer fazer isso. Já tínhamos feito coisas estranhas. E com o tempo as brincadeiras começavam a ficar mais pesadas.
Ela me passou a arma, eu carreguei com uma única bala. Definitivamente aquilo poderia dar muito errado. Em tais situações cruciais, é preciso ter frieza na alma. E mesmo algo alcoolizado, tinha o poder de evocar tal frieza. Aquilo dava medo. Não preciso dizer que a esta altura meu pau ficou envergonhado. Talvez pela dimensão do cano dourado.
Preparei a cena do crime. Coloquei a camisinha no cano prateado, dei uma boa cuspida ali. Ela ficou de quatro. O olho do amor piscava para mim. Tomei o cuidado de avançar o tambor da arma, fazendo que a munição passasse para o outro lado. O lado não perigoso. Então não haveria perigo real. Para ela sim. A mente faz tudo acontecer. A vida é uma cena, bem ou mal feita. Venho chegando a conclusão disto a muito. Amor, ódio, tesão e tudo mais ,podem ser emulados por um tempo indefinível, basta ter disposição para isso. É como uma peça mecânica, tudo se encaixa e o cão é puxado pra trás.
Enfiei o cano devagar, ela gemia feliz. Engatilhei, ela ouviu o barulho do gatilho. Aquilo era poesia. Musica de gemidos e um gatilho puxado, uma bala dourada que escapava do cano.A morte rondando, o prazer, o gozo. Ato definitivo da vida, como se a vida não fosse definitiva. Fiz o teatro que era preciso. Talvez seja isso que as pessoas não percebem. Só precisa-se de um teatro para ser feliz.
O a cano entrou todo. Realmente espaçosa. Por fim depois de uns cinco minutos, Fatima teve seu prazer e tirei o cano agora não mais prateado, borrado. Nos deitamos um pouco, e descarreguei a arma e entreguei a ela:
-Fatima, porque isso?
-Sonho morrer assim, quero morrer no ato extremo da minha vida. Nada de morte idiota na cama de um hospital. Ou em casa cagando, quero morrer na possibilidade de um gozo.
-Acho que você devia parar com as drogas. Um dia brincando, podes morrer de verdade.
-Tu desejas parar de viver?
Ela tinha estes acessos de profundidade aleatória, em meio ao caos. Não queria parar de viver, por mais que a vida esteja uma merda. O quarenta e quatro volta pra gaveta, ela me abraça carinhosamente aconchegada em meus braços. Beija-me com suavidade e diz esta feliz hoje. Me sinto vencido por seus argumentos, por sua doce loucura por não saber que acontecerá amanhã.

Luís Fabiano.

segunda-feira, setembro 27, 2010


Dias amargos

Existem dias que acordar pela manha, é um verdadeiro milagre. Já sei o script de cor. Nada acontece demais, surpreendente ou inesperado. A vida ou morte são um desenho previsível. O comum aguarda. Nem uma bomba cai próxima de minha casa. Ou vizinhos se matam a tiros.
As coisas transcorrem com uma normalidade mórbida. Confesso que cansa. Uma tela em branco. Saber que ao abrir portas, janelas ou que for, nada terá novidade. Mesmo abrindo o coração, aos desgraçados da vida, as sequiosas mulheres a procura de uma esperança em suas vidas. Todos seguem o script. Qual a novidade?
Para mim nenhuma. Elas dizem eu te amo como quem peida. Ao final tudo converte-se em uma sinfonia de caos, com coro Wagneriano. No fundo não culpo ninguém, apenas falo por falar. Como tantas coisas que digo, ás vezes para completar vazios de uma conversa oca.
Cultivei esse estado de ser, minha vida toda. Nós as pessoas comuns somos assim. Reduzo todos a uma dimensão puramente humana.
Lembro que quando era mais jovem, imaginava que as pessoas eram algo surpreendente. Achava muitos amigos inteligentes, alguns até me inspiraram. Mas quando chegam questões, existências, a inteligência desaparecia. Eles se tornam comuns, vulgares e frágeis. Como qualquer um sem inteligência. Naturalmente entendia.
As pessoas não são geniais, elas são o que são. Quem o é, somos nós. Nosso brilho as ilumina, nossa percepção, as torna o que são. Difícil compreender isso. Mas os artistas verdadeiros sabem o que digo. A satisfação não nasce da aprovação alheia. Nasce do prazer pessoal, da entrega ao que se faz, a tal ponto que doar já satisfaz. E isso é contudo. Se você não é feliz consigo mesmo, bem, não espere que a felicidade bata a sua porta.
Nosso esforço inglório é contrário. Queremos ser surpreendidos, ser “pegos” , ser enriquecidos por fora. Como uma correte ordinária, que ganha um banho de ouro. Ela continua sendo ordinária. Nos também.
É preciso minerar-se. Cavar fundo, tirar a terra toda, o lixo para achar o ouro. Brilho único e intransferível. O outro brilho, é emprestado, desgasta-se rapidamente. É a bijuteria existencial. Gostamos destas merdas penduradas.
De qualquer forma, tem dias que acordo, e por um instante nada tem sentido. Olho para os lados e não vejo nada. Nem Deus, nem diabo, nem objetivos, e mesmo a bebida não tem gosto algum.
Os dias demoram a passar, como se tivessem mais que vinte e quatro horas. As esperanças ganham a acidez, e como um relâmpago mental, nem sei porque estou vivo. Poderia acabar agora, não é mesmo?
Mas existe a filosofia. E como magica, abro algum dos muitos livros que tenho a minha volta. Leio um pedaço qualquer, como um comprimido, um calmante, um antidepressivo. E em meio a uma frase de meus malditos mestres, uma única palavra salva. A luz acende em mim. A droga mais poderosa de todas, sinto-me redimido. Como um salmo, uma prece, um beijo sem preço, um abraço do vento.
Então levanto ,abro a porra da janela, olho para a maldita humanidade se arrastando, tentando ser algo. Digo para mim mesmo: então foda-se! Não há nada lá fora, você sabe disso. Tudo esta dentro, no coração, nas entranhas, nas vísceras. Espelho existencial.
Se não sair dali, simplesmente não existe. Nem paixão fulminante, nem ódio radical e todos os outros sentimentos que carregamos e escondemos. O dia será longo mas não há como escapar. O céu esta cinza, e nada parece muito promissor.

Luís Fabiano.
A paz escapa entre os dedos

domingo, setembro 26, 2010


Belo Instante...

“ Sei que mentes ao beijar,
Que mente ao dizer: te amo
Mente-me por toda a eternidade
Que tua maldade me deixa feliz.
E o que mais importa?
Se a vida é uma mentira
Mente-me mais,
Que a tua maldade me deixa feliz.”

Ibrahim Ferrer
Cantor e compositor cubano.

Navalhadas curtas:

“ Sentado na sala vendo televisão. Ela entra feliz e com cara de safada. Provocante ao extremo. Usava roupas sumárias e sorria. Aquilo parecia interessante.
Resolvemos transar ali mesmo. Quando tiro a calcinha, um cheiro de eucalipto invade minhas narinas.
-Que você usou aqui?
-É um desodorante intimo fica tudo fresquinho...
-Sei, certamente você mija aromas florais também? Irritado.
-É pra você...
Desisto da transa, e volto a televisão. Cheiro de eucalipto é demais até pra floresta. Todo mundo sabe que uma boa vagina, deve cheirar a sucos íntimos, a mijo e com uma pitada de aroma de merda. Esse é o cheiro humano, disfarçar isso é negar a própria humanidade.”

Luís Fabiano.

sábado, setembro 25, 2010

Fechando a semana:

Tempos do Tv Pirata.
Humor de primeira categoria, sarcasmo, politicamente incorreto e todas as merdas que hoje ninguém faz. Com o texto do Bussunda.
Guilherme Karan mata a pau em sua performance com Zeca Broduada. Um espetáculo.



quinta-feira, setembro 23, 2010


Navalhadas Curtas: Um entre tantos, é nada.

Caminhar entre os que me são semelhantes, a cada dia me causa mais repulsa. Sim, todos vocês. Creio que caminhamos, para um mundo feito de bolhas térmicas isolantes. Lamentavelmente creio que seja melhor assim.
Tentei observa-los com imparcialidade, hoje, ontem e sempre. Rostos transtornados, fisionomias endurecidas. Uma pseudo-seriedade sulcada, como marcas de um coração arranhado, lanhado. O céu cinza ajudava.
Na esquina um mendigo semi-adormecido, com uma garrafa de cachaça na mão. Invisível como um pedaço de merda. Todos desviavam, sem ver. Uma velha amargurada cuspia:
-É bêbado, fica jogado ai no chão, porque é bêbado, vai morrer assim...
Lembrei de algo que escrevi dias atrás. A esperança surge de lugares inacreditáveis. E o que uns chamam de desgraça, para outros será um benção. Mas vemos tudo pela metade, e sempre a metade pior.
Um bêbado fétido, infecto em um chão imundo, não passa de uma alma tentando defender-se, com as armas que tem, e muitas vezes não tem nada. Apenas isso. Como tantos, ele foi tornando-se um fantasma em vida, visto mas invisível. Mais um sem alma, que não vemos.

Luís Fabiano.
Paz impossível.

quarta-feira, setembro 22, 2010


Putinha

Ela vinha com aquelas calcinhas enfiadas na bunda
Sorridente, fácil e feliz
Dava porque amava dar
A mim, a você e todos
Não importava o sexo
Entregava-se a luxuria
Como um rio encontra o mar
A chuva pura que une-se ao esgoto fétido
Como beijos molhados e traiçoeiros
Ocultando
Prazer, dor, alegria e uma fuga desesperada
Assim era
Fazia-me sentir único
Todos a queriam por trinta minutos que fosse
Queriam sugar dela, não somente as tetas
A bunda perfeita, e a xoxota com pelos ralos
Queriam a alegria dela
O sorriso
Brilho dos olhos, que se vê em quem esta vivo
Disse-lhe isso
Ela me deu o que outros repudiam
A sua vida, sua historia e suas lágrimas
Quando uma caiu, peguei e mostrei-lhe
Dizendo:
-mesmo um diamante precisa de luz para brilhar
Tua lagrima é mais que um diamante.
Sorriu como sempre sorri
E sua doçura interpenetrava a tudo
Além das paredes daquele quarto imundo
Dos gritos selváticos de nossos vizinhos de quarto
Por um instante aquilo foi nosso pedaço de céu
E nós protagonistas
De um jogo que poucos entendem.

Luís Fabiano.

Bicho de Deus


Bicho de Deus.

Pode-se medir uma amizade de várias maneiras. Por coisas que se permitem, e que se fazem entender nos instantes cruciais da existência. Um amigo não é o cara que vai tirar o revolver da tua mão, quando você estiver com vontade de puxar o gatilho nos próprios miolos.

Será cúmplice até o último suspiro. Não estou sendo pessimista, mas existem momentos que a vida realmente não tem porque continuar. Enfiem toda a auto-ajuda no rabo.
Houve uma época que tive profusão de amigos. Que isso fique claro. Profusão de amigos não existem. Muita gente próxima de você, disposta a sorrir, divertir-se e outras tantas coisas boas, não podem ser chamados de amigos. São pessoas que sorriem apenas, e talvez não passem disso. Hoje me restou dois ou três e tá ótimo.

Nesta época, trabalhava com venda de carros importados. Nunca tive problemas com meus patrões. Mas com este tive inúmeros. Ele tinha um estilo de explorar seus funcionários ao extremo. Fazia-nos fazer coisas que não estavam no jogo normal.

Eu deveria atender o publico e limpar o banheiro também, varrer o chão, vender as peças de reposição, carregar o lixo, e se não tivesse nada pra fazer, era para ajudar na mecânica.
Nada pra fazer? Grande filho da puta.

Ele ficava sentado a sua mesa apenas berrando. Façam, isso, façam aquilo. Me tragam um cafezinho. Não foram poucas vezes que ele tomou um café batizado de cuspe, mexíamos bem, ficava invisível. Principalmente porque vivia nos xingando excessivamente,gratuitamente.
Eu o Jorge, que fazíamos o trabalho todo. Eu chegava arrumado, porque ele pedia que viéssemos arrumados. Então ele dizia:

-Vocês dois, vão pra mecânica hoje, se engraxar um pouco - ria sarcástico.

As vezes não creio que existam pessoas assim. Mas o cara era.
Apenas nos olhávamos aborrecidos, mas era o trabalho. Jorge ficava realmente aborrecido. Dizia xingamentos para o filho da puta, pelas costas dele e batizava o café. Depois passava. Nos tornamos grandes amigos pela dor. Afinal aquilo era todo dia. Jorge era um cara bom,gostava dele. Era casado como eu, e sua vida era melhor que a minha. Um dia conversando disse a ele:

-Jorge, se algum dia eu quiser me matar, tu me ajuda?
-Não gosto da ideia, mas se isso for da tua vontade...ajudo, que Deus te receba.

Eu falava sério. Estranhamente isso me dava esperanças.
Mudávamos de assunto. Existiam coisas que salvavam nosso dia.
Fazíamos um jogo de bicho todo dia. Acreditávamos na sorte. Precisávamos acreditar em algo. Um dia talvez ela sorrisse para nós. Para mim trabalhar lá foi um exercício de paciência. Vejo isso desta maneira hoje. Minha vida pessoal estava tão fodida quanto meu emprego. Meu primeiro casamento estava se destruindo dia a dia. Asfixiado pelo ciúmes, pela vontade de controle total de minha esposa e por excesso de amor. 


Pensando melhor, não casei com uma mulher. Ela parecia minha mãe, e eu devia ter uns três anos de idade na cabeça dela. Me tratava como idiota, dizia que amava. Definitivamente as pessoas não sabem o que é amor. Meu trabalho era horrível, ganhava a metade de um salario mínimo e não tinha carteira assinada. Meu casamento não era fácil, tinha as eternas reclamações, que a merda do dinheiro não dava pra nada. Minha vida nunca foi com muito dinheiro mesmo. A dela também, mas agora casada que ela esperava? Chuva de grana?

Todas as manhas chegava ao trabalho e analisava o humor do chefe. Isso definiria o dia. Tinha dias que ele nos transformava em um vomitório. Cuspia, escarrava, mijava cagava e nós ali de boca aberta apenas engolindo. Fazia parte do trabalho. Nos precisávamos trabalhar.
Então ao meio dia, fazíamos a fezinha no bicho, junto ao nosso amigo Sujeira. Ele tinha este apelido porque tinha uma barba imensa e negra, não era muito dado a higiene. Tinha um bafo eterno de cachaça e cigarro. Mas era o bicheiro que tínhamos. Colocávamos nossas esperanças nas mãos deste homem. Nossas esperanças de ganhar um extra, nas mãos de um cara, que vivia bêbado, imundo e tinha uma barba que parecia uma criação de pequenos animais.


O fios cresciam por sobre a boca, ele não cortava. Então ficava aqueles pelos babados, sujos na frente da boca. Naturalmente dificultava de entender o que ele dizia as vezes.
O patrão aquele dia estava com um humor do cão. Eu também não estava bem, e tão pouco Jorge. Todos fodidos. A vida ás vezes parece uma cilada. E todos podemos cair. Confesso que a vontade que tinha, era dar uma imensa cagada, daquelas bem meladas na mesa do chefe. Talvez fizesse. Mais tarde.


Então ao final da tarde, saímos ás dezoito horas. A primeira coisa a fazer era dar uma conferida no jogo feito. É engraçado de onde as esperanças podem vir. Chegamos no cubículo de Sujeira, ele sorria com seus dentes cariados:
-Você ganharam, vocês ganharam...vejam vejam...

Olhei para o Jorge, que ficou congelado, meio não acreditando. Peguei o papeis os números conferiam, ótimo tínhamos ganho...vejam só. A esperança nos abraçou uma vez.
Nos abraçamos os três comemorando aquela vitória. Aquela grana equivalia a um ano de salário. O fedor de sujeira não importava, minha mulher não importava, o patrão filho da puta também:

-E ai Jorge, vamos comemorar ?
-Minha comemoração será, pagando minhas contas, isso vai dar uma folga lá em casa...
-Jorge, você vai pagar as contas depois... e agora você não vai comemorar, nada?
-Não, vou gastar em nada, vou dar pra minha mulher...

Eu entendi Jorge. Mas não concordei. Esse era o estilo dele. Não o meu. Deus tinha nos dado um sinal aquele dia. Eu iria para o bar da Chica. Um conhecido puteiro frequentado por mecânicos, pintores, serventes de obra e todo o pessoal que tem profissões que pegam pesado.
Então Jorge me pergunta:

-Que número tu jogou?
-O numero de nosso calvário. O numero da loja cara.

Ele balança a cabeça. É engraçado de onde pode vir a esperança ás vezes.


Luís Fabiano.
A esperança é uma piada que chora.



terça-feira, setembro 21, 2010

Meus Heróis: Vadinho – Dona Flor e Seus Dois Maridos.

Vadinho é o típico malandro. Mulherendo, bêbado, jogador e ético. Autêntico naquilo que é. Não é simples compreender sua vida, sua emoção e loucura. Quando ama, ama intensamente. Quando joga, até as roupas perde. Disposto a sugar da vida até o ultimo gole. Talvez isso seja, o que ninguém percebe. Prender-se ao podres de alguém é desconhecer esse alguém. Afinal, se você, observar-se bem de perto, não sairá incólume.

Luis Fabiano.


Calcinha da Vizinha.

Houve uma época que morei para fora. Longe da cidade e seu interminável barulho. Me fez bem, mas nenhum prazer é absoluto. Mal ele acaba, e começa o calvário. O desejo de repetir a dose, o gole, o beijo, a carreira, a trepada, de novo e outra vez sempre...
Quando não repete-se, pode ser o inicio dos problemas. As pessoas não sabem deixar silencioso, o que deve silenciar. Não sou e nunca fui um tipo sociável. Daqueles caras bacanas, que gostam de todas as pessoas, que são gentis, que sorriem fácil para tudo e todos. Não é meu estilo. Porem eventualmente, me comporto como um fantoche de mim mesmo. As pessoas não interessadas em verdades profundas. Elas querem sorrisos, diversão e coisas fáceis. Ninguém escolhe o caminho íngreme e estreito. A não ser que vá lucrar algo com isso. Se tiver que carregar o diabo nas próprias costas...bom, as pessoas fazem, se o pagamento for bom.
Infelizmente tínhamos vizinhos “bons” demais. Aquela boa gente que tá sempre querendo falar contigo. Dizer algo e cumprimentar sorridentemente. Na época, minha esposa gostava de receber gente em casa. Eu não. A casa, tinha dias que parecia um comício, de tanta pessoas. Eu chegava do trabalho, sorria daqui e dali. Ninguém notava meu desprazer. Tudo que queria, era sentar-me, comer algo, beber algo e descansar. Talvez transar com ela mais tarde.
Porem nem tudo estava tão perdido. Uma de nossas vizinhas, vinha com o marido sempre a noite. Fazíamos churrascos, bebíamos cerveja e todos riam felizes. Felizes demais para ser sincero. Um dia porem, notei que Márcia estava alta. Vejam só como as coisas são. O diabo esta sempre rondando. Então notei que ao cruzar as pernas ela levantava demais e deixava a mostra a calcinha. E pude ver que as pernas eram boas também.
Todos achavam graça de qualquer besteira. Tudo era divertido. Eu comecei a achar graça também. Principalmente porque os pelos pubianos saiam pelo lado calcinha. Passei a olhar a nossa amiga, esposa do meu vizinho com outros olhos mais ferozes. E graças á bebida tudo ficava em brancas nuvens.
Minha esposa não notou absolutamente nada .Via apenas que a amiga exaltava-se demais, mostrando a calcinha, mas tudo era riso. Ela não conhece homens. Embora dissesse que tinha muita experiência. Mesmo cansado, passei a estimular aquelas reuniões com a vizinha. Churrascos e cerveja. Naquele dia, elas sentaram lado a lado. E o lado mais filho da puta acordou pela enésima vez. A vizinha mais jovem, cabelos sedosos, coxas lisas, olhos de um castanho mel. E minha esposa, mais alta, cabelos meio quebradiços, as pernas não eram tudo isso, os seios levemente caídos. E eu conhecia todos os buracos.
Pensei comigo: se fosse uma corrida de formula um, minha esposa não passaria de fusca. A vizinha era uma Ferrari. Ual.
Márcia bebeu demais novamente, e começa a erguer as pernas. Hoje a calcinha era branca. Começa a falar do casamento, a falar demais e todas as coisas. O marido dizia que eram bobagens dela, as reclamações.
Mas a bebida torna as pessoas mais interessantes. Mais sinceras e dispostas a fazerem o pensam. Fiz questão que Marcia notasse meu olhar. Minha esposa notou também. Ficou brava, porem não muito. Mesmo assim, quando fomos a cozinha, ela disparou:
-Até quando vais ficar olhando pra pernas da Márcia?
-Não pergunte algo que você não quer saber a resposta.
-Para de olhar pra ela... se não...
-Se não o que? Que tu vais fazer ? Se eu olhar para os peitos da Monalisa no Louvre, tu me chamaria de cultural, inteligente. Se olho pra coxas gostosas da Marcia eu sou o que ?
-Um cretino, sem duvida...estas avisado.
-É, e tu também.
Não lido bem com ameaças. Prefiro porradas frontais e diretas. Mas ela sempre ameaçava. Gostava de fazer isso. Eu preferia ignora-la. Além do mais Márcia, bêbada era a mulher ideal. Nada de amor. Ela era uma inspiração inocente, de um corpo bom talvez para uma trepada. E nada mais. Sem amor. Amor não tem nada haver com o negócio. As pessoas confundem muito as coisas. Ela apenas facilitava tudo. O marido não dava atenção aquelas bobagens. Talvez no fundo quisesse que algo acontecesse? Nunca se sabe o que passa na mente das pessoas. Mas na minha eu sabia muito bem o que se passava.

Luís Fabiano.

domingo, setembro 19, 2010

Navalhadas Curtas:

“ Conheço todas as pessoas, porque me conheço cada centímetro. Nada ou ninguém me surpreendem. Venho notando, tudo piora a cada dia. As coisas, a vida, os momentos mágicos vão sendo envenenados pelo tempo, lentamente. Tudo com o tempo converte-se em merda.
Eu sentando na sala, ela adentra com uma mala na mão:
-Pra mim chega Fabiano. To indo embora, tô indo emboraaaaaa !
-Nada poderia me fazer mais feliz – disse com indiferença.
A porta bate e quebra-se o vidro. Essa era a promessa de amor eterno, de felicidade eterna. Não havia nada que se pudesse fazer. Não há nada que ninguém te dê gratuitamente. Tudo tem preço. Amor tem preço, sexo tem preço, crianças tem preço e é isso que se espera, que alguém te cobre algo, o preço.
Então, todos não são previsíveis ? ”

Luís Fabiano.

sexta-feira, setembro 17, 2010

Fechando a semana então suavente: Davi Moares -É D´Oxum



Argentino.

Bebidas deveriam falar
Estoi aqui mi friendo,
qualquer coisa
A garrafa sorri para mim
Cara simpática, preço doloroso
Foda-se
Meu espanhol enferrujado
Meu cansaço noturno
E uma fome de merda
Debaixo do braço, ela veio
Outra vez,
mais uma chance a eles
Sirvo uma taça longa
Escuro e denso
Como pedras vulcânicas
Desce amargo
O maldito macarrão
E o molho vermelho
Como uma menstruação
Enfeitando a massa
Fui comendo e bebendo
A cada gole
Sabia que meu despertar, seria um pesadelo a prestações
A garrafa foi ficando vazia,
Como uma tortura medieval
Gota que cai na cabeça, lentamente
Os braços e pernas esticados destruindo tendões
Por fim vazia,
a garrafa parecia disforme
Maldito chão, que torna-se macio demais
Dormi
Quando acordo, o diabo esta morando em meu cérebro
Tudo dói, pensar dói e respirar também
O estomago revoltado, sai pela boca
Esta foi a ultima vez
Depois de três tentativas com vinho argentino
Eu desisto
Vou tomar mijo das vagabundas
Já tomei alguns bem deliciosos
Mas por hora, eu estou vomitando.

Luís Fabiano.

quinta-feira, setembro 16, 2010


Uma gozada de estrelas.

Depois de algumas trepadas bem sucedidas. Foram poucas. Falo de anos de experiência na arte do amor. Você começa a perceber que umas porradas nem sempre são necessárias. Embora possam dar um tempero especial. O segredo da coisa toda, está no ritmo. É preciso ser como as ondas do mar. Intercalando momentos de suavidade, com uma penetração forte e continuada. Deixando tudo bem molhado e batendo no útero. Como quem bate no céu.
-Há, há, há, cara isso parece filme de terceira...
-É, talvez. Mas ela deve olhar para tí, e ter a sensação que foi comida por mil homens ao mesmo tempo...
-Ual , mil “cajados” arregaçando a vagabunda há,há,há...
Riamos como dois tolos. Por momentos é bom apenas tomar cerveja, e esperar que o mundo foda-se em 2012.Sei que não vai acontecer, mas ter esperança é tudo na vida.
O bar estava decadente, para uma terça feira. A Preta, a proprietária encostada no balcão. E a algumas poucas putas desfilavam por ali, sorrindo e pegando nos paus dos clientes, numa tentativa de convence-los a um programa.
Mas nada de programa. Eu queria apenas ficar no ambiente, vendo aquelas bundinhas semi –nuas, andando pra lá e pra cá. Lúcio me acompanhou nesta empreitada. Umas cervejas, e um papo sem fundamento nenhum.
-Não, pra mim não – disse Lúcio – pra mim tem que ter porrada, ela tem que gemer de prazer e de dor, mais dor tem mais prazer...
-É verdade, porque é contraponto... sei bem como é este jogo.
-Já apanhou?
-Claro. Uma vez, sai com a mina. Ela tinha aquelas manias de couro negro, sabe como é? Botas negras, cinga-liga, chicote e toda a merda...cara, quando entramos no quarto, ela se pirou me batendo. Gostei da brincadeira, decidi que iria participar, mais profundamente. Ela me deu uma chicotada, e eu retribui com uma porrada na cara dela, um tapa bom. Não sei, mas ela caiu, e ficou apagada na cama...
-Tá louco...?
-É, acho que foi forte demais. Porra, se tu entra nessa, tem que segurar. Cara, ela acordou meio zonza depois de alguns segundos. Disse que tinha ido a nocaute. Comecei a rir. Ela se animou, mas o sexo acabou ali. Depois saímos mais vezes. Mas ela pegou bem leve. Eu achei legal. Umas porradas, dá uma adrenalina na coisa toda. Tem o lance do medo, sexo ganha outros ares aí, mas a maioria das pessoas desconhece o que vem depois de uma mera gozadinha da semana.Na quarta-feira...é patético..
-É real.
Nisso chega uma putinha.
-Então, os dois querem fazer algo a três ?
Lúcio olhou para ela, com olhos de quem tinha gostado da baixinha bunduda. Olhei para ele e disse que ficasse a vontade. Hoje eu iria tomar a cerveja, arrastar-me para minha toca. Não precisava comer ninguém. Sentia-me enfadado de putaria aquele dia. Tenho estas coisas ás vezes. Só de respirar aquele ambiente, já tinha gozado mil vezes.
Lúcio sorridente, pega a putinha e vai para os quartinhos nos fundos. Fico sentado ouvindo forró chinelo, enquanto outros tentavam negociar prazer. Quanto vale uma vagina? Ali vale cinquenta reais.
Levanto e pago minha cerveja. E vou embora. O carro estava em casa, de forma que andar pela Avenida ás duas da manhã, era meu passeio final, feito de inferno e céu. Na esquina travestis, faziam um pequeno show, para uns cara que paravam de carro, tiravam fotos. Elas , mostravam a bunda, as tetas e o pau. Os caras fotos e mais fotos. A meia quadra dali, um mendigo enchia a cara com cachaça, em uma garrafa plástica. Sozinho entre trapos imundos. Parecia hebetado.
Um pouco mais adiante, crianças de rua cheirando cola, fumando um baseado. Enquanto uma gostosa fazia boquete dentro de um carro luxuoso, ao lado. Que merda.
Por vezes caminhar nas sombras da noite, é tentar acender uma vela em algum lugar. Por um breve momento, senti ojeriza deste mundo. Destes representantes de nossa humanidade. Das coisas que perdemos, e das poucas que ganhamos. Minha cabeça crepitava. Gostaria que uma chuva viesse, e nos empurrasse a todos para um ralo gigante, a boca do lobo. E que amanha pudéssemos respirar um ar mais puro.
Olhei para o céu, era uma noite estrelada. Talvez ainda houvesse esperança, tudo que se precisa é uma estrela, apenas uma estrela.

Luís Fabiano.

quarta-feira, setembro 15, 2010


Quem amaria Marlene?

Ela olhava meu pau mole e não conseguia conter-se. Ria histericamente. A situação deveria causar-me constrangimento, raiva ou uma destas previsíveis reações tão humanas. Na verdade não senti nada disso.
Sempre que meu pau não sobe é um mal sinal. Não existe vida, condições químicas. Como se ele fosse um Nostradamus de meu destino. Ela seguia rindo, dizendo coisas caóticas. É claro que o sexo aquela noite estava cancelado. Essa foi a primeira e ultima vez que sai com Marlene.
Ela fazia o perfil de uma mulher grande. Melhor, muito grande. Tinha aquela gordura gelatinosa que balança como se fosse uma onda. Isso nunca foi empecilho as minhas empreitadas de amor. Mas aquela noite não tinha como dar certo. Bebida demais, problemas demais, gordura demais. Tanta saturação que até meu membro me abandonou.
A história de Marlene em minha vida, foi uma das coisas mais toscas que se possa imaginar. Ela trabalhava em um clinica, era auxiliar de procedimentos. Os braços grandes, e mãos pequenas.
Conheci a na padaria que frequentávamos. Na hora do lanche. A mesma merda que liga os seres humanos desconhecidos, que todo dia se veem. Éramos estranhos, e dias depois, passamos a nos cumprimentar, e depois pra cama. Nunca foi tão fácil e prevísivel.
Ela fazia parte daquele time de mulheres que estava sozinha e ficaria sozinha. Depois de uma separação, cujo o ex-marido a trocou por uma outra, mais gostosa, mais jovem e mais esperta. Depois disso, teve pequenos casos. Muito poucos, pois ela também não era o perfil de mulher desejável. Mas Fabiano existe. Creio ser este o ponto que mais me agrada. Alguém indesejável. Os refugos estéticos, que a vida dá a descarga. Meu manjar. E a alma? Afinal quem fode com a alma ?
Ela tinha uma boca larga e vermelha. Aquelas bocas que temos a impressão que devorariam um ser humano em uma bocada. O cabelo curto e negro, com olhos verdes apagados.
Na noite em questão, havíamos ido em barzinho na avenida Bento. Tinha uma musica horrível de cara um baixinho, que pensava que tocava muito. Ninguém olhava pra ele. Arrastava uma MPB, e teve ousadia de cantar Chico Buarque. Como diz uma amiga minha: ” Chico Buarque pode tudo.” O cara cantava a Roda. Eu com vontade que uma Roda passasse por cima dele. Era isso e Marlene só falando merda. Que assuntos! Falava de novelas, seriados e vizinhos que jogavam coisas em seu quintal. Isso foi tudo que ela falou.
-Que tipo de coisas Marlene?
-Há, todo tipo, estes dias jogaram fraldas sujas, cagadas, resto de comida...
Comecei a rir. Quem teria uma idéia tão genial de jogar fraldas no quintal dos outros?
-Como gostam de você hein Marlene?
-É inveja. Eu sei que é inveja, eles me chamam de macumbeira, eu nunca gostei deles. Nem eles de mim, mas nunca fiz nada pra eles, sou santa...
A cara dela não convencia a ninguém. Mas fingi que acreditei, até fiquei compadecido de sua magnânima bondade.
-Mas que historia é essa de macumbeira?
-Ficaste com medo né?
-Não. Me sinto tranquilo, eu já conversei com o Diabo e estou em dia com ele...e também já transei com uma mãe de santo então tudo bem.
Riu histericamente. E tomava cerveja.
-Capaz, tu conheces o rabudo?
-É, agora tô querendo conhecer a rabuda...( disse isso apontando com o copo, para a bunda astronômica dela.)
Diga-se de passagem, que aquela bunda, faria um cavalo puro sangue reprodutor sentir-se broxa. A cerveja terminava, ela um pouco alta, me convida diretamente.
-Então, vamos?
Gostei da iniciativa. Raramente as mulheres tem iniciativa. Paguei á gelada e fomos para o motel mais barato. Então voltamos a cena inicial, meu pau mole. O riso da vagabunda. Por fim, ele conteve-se e começou o consolo:
-Fabiano, isso as vezes acontece...não da bola...não esquenta...bla, bla, bla...
-Não estou esquentando. Isso na verdade não é nada bom.
-Calma não é pra tanto drama...
-Você não entende, nada bom mesmo. Você não entende nada.
-Que tu estas falando então?
-Quando isso ocorre, é sinal que não existe nada, realmente nada Marlene. Nada. Nem amor, nem química, nem tesão, nem vontade de gozar, nada Marlene, é como se eu estivesse na presença de nada.
-Tais dizendo que sou nada?
-É. Talvez menos.
Senti em mim que havia ligado o piloto automático do filho da puta. Agora poderia fazer qualquer coisa. A anaconda que enrola-se no coração. Ela agora não ria mais. Ficou séria. E queria saber mais sobre o nada. Mas como meu membro, eu também fiquei indiferente . A voz dela soava longe como um eco vazio, uma brisa sepulcral. Pensei em evocar seu marido, e a gostosa que ele estava. Mas não estava nem afim de falar. Embora ela dissesse que não doía mais. Ela falava muito disso ainda. Ali ainda havia dor.
-Vamos embora, tu é broxa mesmo...
-Ok baby, pense o que você quiser.
-Onde tu vais me deixar?
-No ponto de ônibus, hoje chega de gentilezas, estou cansado de tudo.
-Bem que se vê que és fraco mesmo.
-Não diga isso baby. Não seja cruel comigo, por hora estou incapaz.
-Por hora e para sempre infeliz...
-Eu entendo o teu ex. Ele teve boas razões de fazer o que fez.
Ia dizer outras coisas, mas fui devagar. Ela ficou furiosa, andava pelada pelo quarto me xingando, juntando as roupas, eu deitado na cama, pelado olhando para o teto. Pensando onde eu iria tomar a cerveja, depois de livrar-me daquele saco de lixo ?
Sorri pra mim mesmo. Não havia filosofia que salvasse aquela situação, quando algo é assim, precisa-se dar um foda-se.
Vesti-me com a maior paciência do mundo. Saímos do motel, e deixei na Osório ás duas da manhã. No dia seguinte ela não falou comigo na padaria:
-Por favor, um cacetinho.

Luis Fabiano.

terça-feira, setembro 14, 2010


João De Barro.


Eu achava que aquela mania dele era um pouco estranha. Enfiar dedos no cu, e depois cheirar, como se estivesse cheirando a flor mais perfumada da vida, era algo diferente. Mas hoje olhando com um pouco mais de consideração, acho que o entendo. Mas ainda não apertaria a mão dele.
Estávamos naquela idade, onde meninos se tornam homens, ao menos alguns. Tive amigos que fizeram outras escolhas. Eu contava com dezessete e Danilo era o mais velho de nossa turma. Agradeço a Deus por nunca mais ter visto ninguém de minha adolescência. Até hoje considero que foi a parte mais idiota de minha vida. Lembro que queria crescer logo, ter meu emprego e constituir o que a sociedade chama de normal. Mas tudo deu em nada.
Tive muitos problemas com Danilo. E mesmo com habito tão estranho, era o brigão da turma. O mais macho, o valentão o cara que fazia e acontecia. Eu o achava idiota. Estava sempre na esquina de minha rua, sentado cheirando os dedos perfumados. Naturalmente, que isso lhe rendeu um apelido, o João de Barro.
Os dedos estavam sempre sujos nas pontas, de merda. Quando ficou sabendo do apelido os problemas começaram de forma mais intensa. Quem dissesse o apelido estava ferrado. Na primeira oportunidade eu disse. Tive uma briga com ele e me dei mal. Nada sério sobrevivi, apenas o ego ficou um pouco arranhado. Mexeram muito comigo, mas eu disse o apelido cara dele. Eles ficavam falando as escondidas, nos cantos.
Depois deste episódio do apelido, minha amizade com Danilo acabou. Tornou-se inimizade. Ele se tornou aquele cara chato e perseguidor. Com dezessete anos eu já estava me treinando a tornar-me indiferente as pessoas, as dores, as perdas e as vezes ao bem.
Meus colegas não entendiam muito isso. Eu falava de imperturbabilidade. Me chamavam de maluco. Minha família me chamava de maluco, então estava segundo eles enlouquecendo homeopaticamente.
Tentei vários caminhos para isso. Meditação, concentração, religião e outras coisas. A natureza sabe o que faz. Com o tempo fui sentindo esfriar em mim, a paixão pela vida e a tudo que a ela se relaciona. As leituras e as conversas que tive, me ajudaram muito.
Danilo continuava chato. E eu o usei para testar minhas teorias. Não foi nada fácil aprender a olhar com indiferença para aquilo. Mas neste aspecto o venci. Mas as brigas continuavam. Quando estávamos em grupo, ele queria que eu fosse embora assim que chegasse. Fiz algumas vezes, para evitar confronto. Não gosto de confronto direto. Não pelos outros, mas por mim mesmo.
Neste dia em especial, comecei a entender as escolhas conscientes que fazemos na vida. Ele chega, manda eu ir embora. Eu estava frio. Apenas disse que não iria. Como as mulheres furiosas que falam, falam e falam sem parar, ele fazia ameaças. Eu estava tranquilo. Porem achava que era preciso fazer algo. Ainda não sabia bem o que.
Fisicamente estava em desvantagem. Então a metade de um tijolo no chão, me pareceu um verdadeiro cristal. Finalmente Danilo veio para cima, empurrando não tive duvidas. O tijolo acertou acara dele. Que parou de falar. Sua face ganhou nova pintura. Não preciso dizer que isso causou problemas aos meus pais com os vizinhos.
Danilo tornou-se vitima de um delinquente. Não expliquei nada, todos sabiam da historia. Passei a aguardar que ele se recuperasse, e claro viesse buscar sua vingança.
A ideia de apanhar me parecia justa. Ele me bateria, ficaria com o ego em dia e não me importunaria mais. No fundo até hoje pra mim é isso que me interessa. Não ser importunado. Faço o possível para passar invisível. Gosto de ser o que ninguém lembra, o que fica oculto, o verminoso.
Danilo recupera-se, e torna a estar no grupo. Porem não fala comigo. Creio que foi a melhor solução. Naturalmente não imaginava, que eu queria compensar o nariz quebrado, os lábios cortados e o rosto inchado. Não sentia arrependimento. Que me recorde, nunca senti isso em minha vida. Agora com dezoito anos, achava as pessoas que se arrependem tolas. Até hoje acho. Não pensaram, agiram como agiram e agora choram. Não chore. Foda-se dignamente como qualquer pessoa.
Acabou que nunca aconteceu nada. Nem vingança, e a vida nos separou definitivamente. Na semana passada fiquei sabendo que ele fez escolhas erradas em sua vida. Morreu cheio de tiros, como um bom valentão. Começo achar que o tempo as vezes não muda nada.Que me torno mais cínico a medida que a idade chega. Caro ex amigo, mande lembranças ao demônio, um dia nos encontraremos lá.
E tudo isso, por causa do cheiro do cú.

Luis Fabiano.

segunda-feira, setembro 13, 2010


Chuva

Hoje chove
Outra vez
Deveria ter passado
Em nuvens cinzas
carregadas
como qualquer chuva tola
como nossa insipida estupidez
Mas as coisas por vezes segredam
Silenciosamente
misteriosamente
Senti uma vontade
De chover
Inveja das nuvens mais escuras lá fora
Minhas lágrimas
de uma vida
Expulsar
Angustias afogadas
Lentamente,
Afastar
tempestades sem vento
Granizo
sem brilho
Torrentes enclausuradas
As comportas se abrem
A chuva lá fora não para
E canta
Inunda a tudo
A todos
As letras
ficam nubladas
E se fazem também gotas.

Luís Fabiano.

Pesadelo real.

Como a vida irreal, quase tudo que nos cerca é cenário e efeitos especiais. Dores, felicidades, derrotas e algumas vitórias. O que as define é muito simples. Estreito, extrato. Uma emoção que não se eterniza embora pareça eterna. Que fenece com o passar dos tempos.
Como a validade de tudo a nossa volta. Se esgota dia a dia. E se não for pela grandeza e intensidade do momento em si, já o perdemos.
Leio toneladas de coisas, destes autores que amo e respeito. A procura de uma frase. A frase que salva, e faz brilhar por um instante a verdade. Tudo que se precisa, uma gota.
Um único momento de brilho, a faísca. O restante descrito é cenário oco. É nossa idiotice em sondar vazios. Os preencher com nossa abundante ignorância.


O bar começava a ficar enfadonho. As coisas tem seu ritmo natural. Depois de algumas cervejas, dependendo do momento que estivesse vivendo em minha vida. Poderia descontrolar-me, ou caminhar para minha casa lentamente. Tudo era possível.
Olhava para as fisionomias bisonhas dos que estavam comigo. Todos a um passo do céu e do inferno. Drogavam-se, bebiam e queriam trepar. Tudo fácil e instantâneo e sem preliminares. Notava-lhes a inconsciência original. Era tudo que tinham. E eu estava ali também. Mas por um instante os odiava.
Talvez não fossem eles, e sim a mim mesmo. Odiamos os outros por nós mesmos. Das coisas que compartilhava. Mas haviam abismos entre nós. No instante que quisesse, poderia mudar o rumo de minha vida. Sempre achei fácil me desfazer de tudo a minha volta. Como se em verdade nada existisse, ou fosse de verdade. Coisas boas, coisas ruins acabavam no final tendo o mesmo peso.
Como as ideias em minha mente. Dançam soltas, e ás vezes se encontram. Valéria me olha com alegria tosca. Tinha fumado, tinha bebido e cheirado. Na sua magreza anoréxica, sorria como um João bobo. Suas amiguinhas á volta não estavam muito diferente. Ela frequenta tanto aquele bar, que é conhecida por todos. Cliente especial.
Mas neste dia não estava com saco pra ela também. Fazíamos uma espécie de ritual informal. Encontrávamo-nos sem marcar, naquele mesmo bar da Avenida. Conversamos um pouco, bebíamos um pouco, e estávamos prontos para o amor.
Valéria esta longe de ser meu perfil de mulher. Tinha ossos demais. Mas enlouquecia quando ficava de quatro. Gemia como uma cadela no cio. Lembro que uma vez pedi para que ela latisse alto, uivasse enquanto eu a arrombava. Ela fez com vontade. Adoro cadelas que fazem anal.
O grande problema que Valeria nunca estava normal. Seus neurônios evaporavam dia a dia. Eu pensava nisso ás vezes. Mas tudo que queríamos era nos divertir. Foi assim que nos conhecemos e creio que assim que ficaremos até Deus sabe quando. Por vezes estava tão bêbada que adormecia. Eu precisava terminar o serviço sozinho. Abria as pernas e ficava trabalhando ali. Ela dormia, nem percebia que eu estava ali dentro. Gozava e tentava tirar um sono.
No dia seguinte ela perguntava se tinha gozando nela, e estava bom?
-Sim claro. Você é boa até dormindo. Tua xoxota tem consciência própria.
Ela sorria e pedia desculpas. Eu desculpava. Creio que ninguém poderia entender. Ás vezes me sentia um vampiro. Ela achava que era bom para os dois. Mas no fundo eu sabia que ela não tinha escolha. Que seus dois filhos a ignoravam. Que sua família, a achava uma pedra no sapato. Que seu ex-marido não queria ver aquele rosto vivo. Eu estava ali. Saboreando o resto dos tutanos. Dando e recebendo um pouco de amor. No fundo é que todos querem.
Foda-se a filosofia, a religião e a merda toda. Quando a impotência, a derrota, a solidão e a dor batem, o insondável torna-se ridículo. Deus estará em um copo cheio e bem grande, em algum entorpecente qualquer, que faça efeito rápido. E o amor é das drogas mais fortes.
Naquele dia depois que trepamos, ela adormeceu, eu não. Levantei nu e fiquei olhando-a, de longe. Ela encolhera-se na posição fetal. Parecia ter frio. A pele branca, a magreza, as veias verdes expostas na pele transparente. Por um breve momento senti uma dor em mim. Por um segundo creio que a olhei como realmente era. Uma criança. Não interessava que estivesse velha e destruída fisicamente, quem vê apenas isso não vê nada.
O cigarro se apagou. Fui até ela e a abracei. Deixei que se acomodasse como um bebê nos meus braços. Detestaria sentir pena dela. Mas senti compaixão. Queria ter poderes para tirar toda a merda de dentro dela.
Mas como é possível mudar a intenção dos homens?
O mais terrível de tudo. Em breve ela acordaria e teria que voltar para sua vida, seu pesadelo mais real. Mas por agora nos dê apenas mais um minuto, um beijo de eternidade.

Luís Fabiano.
A paz é o soco justo, que perceberá depois que acordar do nocaute.

domingo, setembro 12, 2010


Navalhadas Curtas:

Eu sentado na sala. Olhava qualquer merda na televisão. Ela entra:
-Que mais tu queres?
-Hã ?
-Sou linda, rica, gostosa, fiel, te amo, trepo como uma vadia como gostas e ainda te banco. Então, que mais tu queres?
-Você acha que isso é tudo?
Balança a cabeça afirmativamente, tinha uma certeza inabalável. Fiz questão de lembra-la da data de onze de setembro. Nada é inabalável.
-O que podes me dar, é tua ausência. Simples. Suma como uma torre.
Aquele silêncio foi maravilhoso.

Luís Fabiano.

sábado, setembro 11, 2010

Nei Lisboa - Romance

Lindos cabelos fúteis.


Lindos cabelos fúteis.

Como sempre, á distancia tudo é sempre melhor do que é. Quando ela entrou no carro parecia que tudo iria caminhar para um paraíso de prazer, beleza e diversão. Mas pergunto, oque na vida é assim? Onde? Depois de qualquer prazer ou junto com ele, vem o enfado. Talvez seja uma reação química natural. Não sei. Normalmente não espero nada das pessoas, por saber que elas não tem nada a me dar.


Começamos a conversar na Bento. Minha conversa nunca é inocente. Tudo não passa de um imenso teste. Ás vezes elas conversam bem, mas trepam mal. As que falam mal, por vezes trepam bem, isso é uma lei da natureza, uma tentativa de suprir nossas piores falhas.


Tatiana era pessoalmente insuportável. Fazia o perfil daquelas mulheres de frases prontas. Cheia de jargões populares. Citações que ela apenas repetia, mas não entendia o sentido.


O cabelo dela era um problema lindo. Ela mexi-o para todos os lados. Segurava, balançava a cabeça. Quando este espetáculo começou, tive vontade de coloca-la por a fora.


Com duas cervejas, ela falava dela, tudo. Se vangloriava das coisas difíceis que passou na vida. Grande merda. A cada dia que passa detesto mais gente que fala de si mesma deste jeito. Não me fale nada, por favor.
Embora estivesse interessado em descobrir os mistérios daquela xoxota, o que estava á volta dela era terrível. Talvez não viesse a descobrir nada. Tati era bonita e cansativa. Ainda bem que xoxotas não falam. Por que creio que me tornaria casto para o resto da existência.


O bom destas conversas fúteis, que sempre é possível ser criativo. Inventar algo que torne o papo interessante. Ela fala demais, você escuta, toda a mulher que fala demais é uma presa, justamente porque se expõe demais. Ela sorri e diz:


-E tu Fabiano que tu fazes da vida?
-Depende...depois que tu sai da detenção, agente tem que pensar na vida...sabes...


Ela se engasga com a cerveja, recupera-se e fica me olhando. Eu sigo:


-Minha vida agora tem um novo começo, me livrei de todos os problemas e graças a Deus agora quero levar minha vida honestamente, longe do crime e das drogas.


Ela ri nervosamente. Falei muito sério, olhando nos olhos naturalmente sem forçar. As pessoas gostam tanto de verdades.


-Tu teve preso?
-Sim. Isso acontece as vezes.
-Tá falando sério?
-É claro.
-Nunca conheci ninguém que tenha sido preso. Que tu fez?
-O que fiz foi ser pego... É um assunto delicado e me emociona, vamos trocar...
-Claro, claro, desculpa.


O clima dentro do carro agora havia ficado mais interessante. Uma arte. Havia uma tensão suave no ar. Ela falava agora mais cuidados. Parou de mexer no cabelo e tomava mais cerveja. Acho que não iria transar comigo. Mas pra mim isso agora nem me interessava mais. O prazer é algo sutil, que cala nas entranhas, com ou sem porra, com ou sem xoxotas. Bater uma boa punheta em casa e tudo bem.


Inesperadamente ela me dá um abraço. Surpresas da vida.


-Sabes Fabiano, eu sei como é começar a vida novamente, tive desenganada no hospital, entre a vida e a morte, agora to aqui. Nova, quero ser uma outra pessoal.


Aquilo foi a melhor coisa que ela me disse aquela noite. Era um clássico, mas gostei. Parecia sincera. Nos beijamos e minhas mãos percorreram aquele corpo. Bons peitos e uma boa bunda. Ela parecia relaxar nos braços de um ex-detento. Unidos pela transformação.


Brincamos um pouco, e para um primeiro encontro estava bom. A deixei em casa. Fui embora. Minha cabeça dançava ao tilintar das verdades e mentiras. Acho que fiquei um pouco triste, por entender que as pessoas são mais fúteis que seus feitos.


Beethoven, Picasso, Wagner, Gaudi e outros tantos, não tão grandes quanto suas obras. O homem cria coisas maiores que si mesmo e ainda assim pode olhar para cima. Que merda é essa?
Tornei-me personagem de mim mesmo, ela mergulhou na viagem, minha arte,minha mentira.


Sentia-me cansado e meio bêbado, a punheta ficaria para manhã seguinte, por hoje chega de xoxotas encantadas.


Luis Fabiano.
Cara ou coroa?


sexta-feira, setembro 10, 2010


Pérola do dia:

“ Quando penso nas milhões de xoxotas no mundo...realmente pensar em
tê-las em uma única existência é impossível, serão preciso algumas vidas...”

Luís Fabiano.

quarta-feira, setembro 08, 2010

Dica de filme: A Caixa – The Box – 2009.

O filme é interessante pela proposta. Que nos coloca uma idéia, do quanto temos consciência das outras pessoas que existem? Você perderia o sono, a tranquilidade por alguém que não conhece? Se essa pessoa faria diferença morta ou viva?
Se descobrir a resposta, entenderá o porque da humanidade estar como está. Uma boa pedida, pegue leve e veja.


Vomitório de amor

Você não me ama mais?
Que foi que fiz?
Hoje estas diferente?
O dia foi bom?
Que cara é essa?
O dia de trabalho foi bom?
Hein?
Te liguei hoje, e você não atendeu?
Porque?
Estas distante?
Vamos fazer amor?
Me abraça?
Agora?
Ta fazendo porque quer ?
To te forçando?
Sente saudade de mim?
Me quer ?
Lembra quando nos conhecemos?
Por que mudou?
Sou importante pra você?
Muito ou pouco?
Somos cumplices ?
Confidentes?
Sente tesão por mim?
Me acha bonita?
Quer me comer?
Hoje?
Precisa de mim?
Lembra de nosso primeiro beijo?

Houve um breve silêncio sepulcral
A mão rasgando o vento
Velocidade de um míssil
O estampido na face dela.
Novo silêncio.

Luis Fabiano.

Sinfonia da morte.

Trabalhar no hospital foi muito bom. A gente encontra extremos de todos os níveis. Dor extrema e prazer extremo. As pessoas acham que tais situações não combinam, mas na verdade elas são complementares. Sentimos uma pela ausência da outra.
Você já trepou em uma UTI lotada, com gente mais morta que viva? A sinfonia dos respiradores, medidores, oxigênio, remédios. A vida travando uma luta mitológica contra a morte? Confesso que só de pensar meu pau sobe.
Por uma infelicidade não tive essa oportunidade. Não naquele hospital. Nunca surgiu a oportunidade certa. Namorei com algumas enfermeiras. Aliás fantasia sexual de todo homem decente.
Aquela roupinha branca, fio dental branco, sutiã branco a porra branca. Muito bom, lembra uma pureza conspurcada.
Nesta época eu pegava pedaços de gente para fazer exames. Eu carregava tais pedaços ao laboratório, de forma que estava sempre no Bloco Cirúrgico. Ao lado ficava a Uti.
Lembro de um velho que estava em coma lá. Nunca ninguém o visitava. Muito magro, definhava a cada dia, a morte zombava daquele jogo ganho. Se não fosse por entendimentos mais espirituais, eu diria que deviam desliga-lo.
Em tais ambientes as pessoas criam um ar tão profissional. Sentimentos profissionais. Não se detém na sutileza de uma situação. Não tem tempo pra isso. Abstraem para fugir da dor e resolver problemas.
Chamam de paciente e mantem a distancia técnica. Todos os dias eu ia buscar pedaços humanos. Um açougueiro informal. Era bom. E tinha Joana, a enfermeira com uma bunda premiada. Todos os a adoravam. Por que era gentil, gostosa e não se fazia de difícil.
Falava de putaria tranquilamente. Entre aqueles quase cadáveres. A encoxei algumas vezes. Um dia nos pegamos em um quarto particular do hospital. Ela queria trepar e não interessava muito com quem, gostava da função. Adoro mulheres fáceis de qualquer profissão.
Nessa época eu trabalhava em qualquer coisa, precisava de grana. Quando a coisa ficou realmente feia pro meu lado, tinha pensado até em vender meu sangue, um rin etc... Mas acho que ninguém iria aceitar. Seria politicamente incorreto. Expliquei isso quando seu bolso esta completamente vazio e sem perspectivas.
Ver aquele senhor morrendo, dia a dia sozinho tocou-me de alguma forma. Talvez ele representasse nosso barbarismo. Talvez ele fosse um canalha, que fodeu todos a vida inteira, e agora recebia o premio da indiferença? Ou então ninguém sabia que ele estava ali? Fiquei sabendo depois que os familiares o trouxeram, e desde então apenas pagavam a conta. Ele tinha setenta e oito anos. Não iria julgar a situação, mas agora achava que ele era um filho da puta. O coma dele parecia uma morte. Passei a desejar que ele morresse de uma vez. Era uma estatua viva.
Tais reflexões eram um espelho. O ser humano é mesquinho noventa por cento da sua vida. Que interessava se o velho não prestava? Que tenha fodido a tudo e a todos. É isso que devemos guardar dentro de nós? Ele fez o que fez. E nós o que faremos? Justificaremos nossas falhas, pelas falhas de tudo que nos cerca. Sem grandeza.
Sempre perguntava a Joana como estava o velho:
-Na mesma, acho que ele esta fazendo vestibular para ir para o céu ou inferno.
-Sozinho desse jeito, acho que nem o diabo o quer lá.
Riamos. Mas no fundo eu achava uma merda morrer assim. Esquecido, abandonado, indiferente. Pensava: se um dia isso acontecer comigo, e não tiver volta, tomara que desliguem a merda toda, puxem os aparelhos da tomada. Foda-se.
Naquele dia voltei a Uti para pegar um estomago que havia sido retirado de um cara com câncer. Você já viu um estomago doente aberto? Não é a coisa mais linda. Merda e podridão que não se imagina que aquilo saiu de um ser humano.
O velho aquele dia tinha dado sinais de vida. Porem quando eu cheguei, eles estavam tentando ressuscitá-lo, mas não deu. Joana diz:
-Ele abriu os olhos de-repente, disse algo que ninguém entendeu e apagou.
-Sei Joana. É uma lâmpada quando esta prestes a queimar, fica mais forte e depois já era.
-Isso, o velho teve um tremor e tudo ficou silencioso.
-Puta que pariu, que merda morrer assim.

Luis Fabiano.

terça-feira, setembro 07, 2010


Amado filho da puta

Manter seis mulheres ao mesmo tempo, não é uma tarefa fácil. Mas houve um tempo que me permiti esta jornada de amor. Ás vezes tudo não passava de uma imensa engrenagem, que funcionava automaticamente.
Sou honesto. Jamais prometi que era exclusivo. Jamais prometi que ficaria para sempre, jamais disse que seria fiel na saúde ou não doença, na riqueza na pobreza e principalmente seria fiel. Entendo tais conceitos como algo embotado. Repletos de frases prontas e muito cinismo. Não pertencemos as pessoa, ainda que nossos corações se entrelacem um pouco. Permanecemos em nossa solitude. Intocável enfrentando agruras de um mundo que se desfaz diante de nossos olhos.
Amor, carinho, conversas animadas, dividir algumas dores e boas trepadas. Isso posso dar. Dizem que sou cínico. Não espero que entendam como funciona meu amor. Amava a todas indistintamente. Cada uma com seu estilo, suas características, sua beleza. Tão diferentes uma da outra, tão sedentas de tudo. Queriam me engolir. Que eu ficasse morando dentro delas, talvez para sempre.
Minha vida era boa. Naturalmente alguma ou outra, não se comportavam bem. Começavam querer demais. Diziam que tinham apenas pedaços de Fabiano. Ironicamente, eu dizia que era um imenso quebra cabeça, me dou aos pedaços. Quando você montar tudo, acabou a diversão.
Pareciam que combinavam-se inconscientemente. Suas menstruações eram no mesmo período. Ficam com o humor avariado. Eu era um maestro regendo sangue e mau humor. Neste período aprendi a dar o Foda-se as situações mais funestas da existência.
No fim tudo resumia-se em amor. Ás vezes me destratavam. Eu sumia por alguns dias. E tudo ficava naturalmente bem.
Meu amor tem um preço alto. Mas nunca exigi absolutamente nada de ninguém. Não tenho esse perfil. O que tornava a minha leveza densa. A grande maioria esperava o que ? Que um dia eu virasse um maridinho, homem da casa. Tenho perfil de maridinho? A quem se engane.
Depois de alguns casamentos, creio que minha alma esta mais para sultão. Uma delas uma vez me elogiou dizendo que tenho alma de cafetão. Gostei muito. Saí rindo enquanto ela me jogava uma panela uma vez.
Monica foi a mais escandalosa das mulheres que tive. Impulsiva, descontrolada, passional, gostosa e amável. Tudo nela era demais. Puro exagero e adrenalina. Ela me dava tanto carinho que chegava a dar-me repulsa. Me enchia de beijos molhados e não parava. Me lambia com muito entusiasmo. Gostava disso. Quando me chupava, parecia um aspirador de pó. Queria sugar minha alma por ali.
Mas bastava uma palavra para tudo virar um inferno. Como uma tempestade, um furacão categoria cinco. A briga era com ela mesma. Não queria que eu falasse da existência e outras. Criou para ela mesma uma ilha de exclusividade. O amor é muito estranho. As vezes eu fazia de propósito, dizia o nome de outra erradamente, era na hora. O pau poderia estar dentro dela, ela me afastava. Começava a falar sem parar:
-Ainda vou te matar, pra ninguém mais te ter.
-Acalme-se amor. Acalme.
-Acalma nada, não sou como essas vagabundas tens por ai...
-Não ofenda a profissão. Elas são uns amores...
-Tu és um idiota mesmo. Não leva a sério nada e nem ninguém, os sentimentos dos outros estás cagando...
-Cada um com sua natureza. Eu escolho o que quero sentir...a maioria das pessoas não tem essa possibilidade.
-Isso não passa de cinismo das merdas que lês...
-Pense o que você quiser amore mio...
Mas era tarde. Colocava minha roupa e ia embora. As pessoas são passionais demais. Quando estava assim não se despedia de mim. Quando eu chegava em casa, o telefone tocava. Era ela pedindo desculpas, amor e meu pau. A montanha russa chegava ao termo. Dizia que estava tudo bem, outro dia eu voltaria. Aí trepávamos cheios de saudade. Meu amor isso, meu amor aquilo.
A vida poderia ser melhor? Creio que não. Tinha alguns aspectos inconvenientes, tal quantidade. Eu tinha de economizar porra. Nada de fodas com banhos de porra...nada disso. Gozava ás vezes e intercalava com a outra. Eu tinha uma escala mental de gozadas. De um modo muito estranho todos estávamos felizes. Eu estava.
Mas algo assim não é feito para dar certo. Foi acontecendo o inevitável. Uma a uma foram indo embora. Melhor, fomos nos afastando. Elas já não queriam mais aquilo. Sabiam que tinham sem ter-me.
O coração daquelas mulheres precisava de um amor “tradicional”comum e simples, todos querem. Menos eu. Coisa estranha. Não sou tradicional. Minhas piores e melhores emoções estão reservadas para mim. A última a me dispensar, foi Maria Helena.
Uma boa convivência de alguns meses. Ela fazia o perfil da mulher comportada. Justamente o que não gosto. Mas a bunda e as tetas valiam ouro. Muito educada, pedia desculpas até quando peidava. Uma vez ela fez isso, tinha acabado de peidar, um peidinho tímido sem graça e disse:
-Opa, desculpa amor tá, escapou.
-Escapou? Desculpa? Que isso?
Eu a virei de bunda, baixei a calcinha e enfiei minha língua no rabo dela. Uma delicia, gosto, cheiro tudo...Ela ficava as vezes meio contrariada ou constrangida nem sei. Eu gosto disso. Na nossa despedida ela ficou na porta. A olhei com ternura. Mesmo sendo o idiota que sou. Gostava dela, não tão somente pela insanidade que aparentava, mas por tudo. Conversamos muito civilizadamente. Agora havia pérolas em seus olhos. Ela secava devagar, seus movimentos lentos como que extrai a própria pele:
-Não posso mais. Fabiano, não posso...preciso ficar em paz. Não me sinto legal levando minha vida assim meu bem. Te quero aqui comigo. Tu estás dentro de mim, lugar onde não sei se irei te arrancar, mas preciso tentar. Sei que não foi o que combinamos. Mas eu não consigo mais. Tudo isso tá me fazendo um mal grande. Saber que não és meu me mata. No inicio parecia bom, mas agora...não.
Não sou bom de despedidas. Tentei dizer algo, mas Helena coloca a mão na minha boca:
-Se não vai dizer, que ficarás aqui, então não diz nada. Por favor não diz nada, apenas sai. Tá bom.
Levantei daquele sofá macio que fazíamos amor sempre. Algo pesava em mim. Cheguei á porta e sai. Nunca olho para trás quando faço isso. Subi no carro, não queria pensar em nada. Olho para a porta Helena estava ali chorando. Não queria sentir nada. Mas vê-la assim não foi bom. Acho que estou enfraquecendo, que merda tenho que ficar de olho.

Luís Fabiano.

segunda-feira, setembro 06, 2010

Flavio Ventirini - Noites com Sol



Mar adentro

Nos encontramos efusivamente
Ela está linda
O sorriso fácil
De quem ama e trai
Gosto dela, de meu jeito
Meu coração é um navio
Que perdeu a ancora
Ela quer ser meu porto seguro
Mas tem seus tornados também
O cabelo esta lindo
Nos despimos
Tentando dar paz um ao outro
Coloco fundo nela
De quatro
Gozo duas vezes
Ela também
Uma sede sem saciedade
Por fim deita nos meus braços
Tudo que vejo são suas
Tímidas lágrimas
Um cisco no olho ela diz
Sabemos tudo em silencio
Mas não queremos tocar ali
Mergulhamos na quietude
De corpos cansados
Entre suor, esperma
Almas que se veem
E mesmo que não seja a coisa mais certa
Nos sentimos felizes assim
E quem apontará a um coração feliz
O certo e o errado?
A lâmina ou a seda
Nos enroscamos um ao outro
Sem ancora
Sem navio
Sem porto.

Luís Fabiano.

Você que sabe...

Quando saímos do laboratório, o silencio era uma neblina de chumbo entre nós. O papel impresso entre suas mãos, meio amassado como nos sentíamos. Engrenei o carro e fui andando devagar.
Tudo apontava para uma conversa difícil. Para mim pensava em questões praticas. Embora estivesse envolvido até os ossos, não gostaria de decidir nada. O silencio intragável, o ronco do carro era suave, deslizando na estrada do laranjal. Voltando pra casa.
Então Jordana dispara:
-Para o carro agora.
-OK.
Estaciono o carro. Ela chora silenciosamente. Lágrimas exprimidas de emoções fatigadas. Em tais instantes, temos vontade de não estar onde estamos. Sobretudo quando a merda vem á tona, até a garganta e quer nos afogar. Ela desce do carro acende um cigarro. Está tremula. Não podia deixar de pensar no paradoxo de tal situação.
Normalmente um filho é aguardado, esperado com carinho e todas estas coisas que entendemos como normais. Mas não no nosso caso. Jordana não queria aquele filho de jeito nenhum. Para mim foi uma surpresa também. Mas estava disposto a acatar a decisão dela. Afinal não seria no meu ventre que ele iria crescer e sairia para um mundo em delirio.
Nestes assuntos cabe a mulher decidir em termos práticos. Se ela quisesse ter o filho eu ajudaria, era apenas grana. Se ela não quisesse ter o filho eu ajudaria, pois afinal é apenas grana.
Ela olha-me tensamente:
-Então o que vai ser?
-Bem o que você quer ?
-Eu odeio essa criança dentro de mim.
-Então você já a matou...
-Não quero me preocupar com ninguém. Ainda mais alguém que poderá precisar de mim para o resto da vida. Somos muito azarados Fabiano. Que merda.
-Sim Jordana, é possível que seja para o resto da vida.
Ela sorri secamente.
-Pra ti é fácil né filho da puta!
-Eu avisei, eu sempre aviso, mas você disse que estava tudo bem.
-É eu sei. Isso me torna mais culpada.
-Não, isso faz perceber que ambos somos dois idiotas... e que talvez tenham um terceiro...
-Nem pensar, apenas falei para saber o que pensavas...daqui não sai filho.
O nervosismo deu lugar a raiva. Raiva de mim, raiva daquele ainda viria e quiçá de toda a humanidade. Não tenho dramas de consciência. Nunca soube que é isso. Afinal Jordana não era o amor de minha vida. Era uma mulher interessante, que tinha contato intimo e que naquele dia a porra da camisinha rasgou, uma autentica zebra.
Ela sobe no carro novamente e pede para que a deixe em casa, depois ela falaria comigo.
-Jordana, veja lá o que vai fazer, faça de uma forma correta, gostaria de poder ajudar...
-Cala a boca, és parteiro agora?
-Ok, você é grandinha e vacinada, depois dos vinte e seis se você ainda não sabe o que quer, não serei eu que serei sua babá!
-Isso.
Chegamos em sua casa, ela desce do carro e antes de sair diz:
-Não me procura, eu não quero mais te ver.
-Tudo bem.
Realmente ela desapareceu. Não sei se esta viva ou morta ou o que fez. As vezes queremos que as plantas cresçam sem raízes. Que floresçam sem agua, sem sol, sem que ninguém as esteja olhando.

Luís Fabiano.
A paz é uma ave que nunca pousa.

domingo, setembro 05, 2010


Dias.

Tem dias que o cano de uma arma, nos sorri com mais simpatia. Dias que o cinza se faz negro. Que a neblina é densa e fétida. Olhamos embasbacados as pessoas, no afã de achar um culpado. Apenas um. Deste vulcão prestes a explodir em nossas entranhas.
Qualquer um serve. Todo o idiota é bem vindo. Os de bom coração também. Os puros de qualquer coisa. Os nascidos e os que nunca irão nascer. Foi exatamente assim que acordei hoje pela manhã.
Normalmente não somatizo nada. Mas dias de chuva que não cessam, talvez estejam transtornando meu parco humor. Não preciso dizer, que encontrando um único filho da puta. Iria vomitar minha bílis negra nele. A paciência estava exígua. Não suportava nem a mim.
Era preciso sair a rua para pagar contas. Filas imensas estavam sem graça. Todas as bundas lindas que amo, pareciam disformes. Nem a xoxota mais encantada faria meu coração bater diferente.
Por um breve instante, entendi a cabeça dos psicopatas. Quando agridem, matam, aparentemente de forma gratuita. Tudo soava repugnante. Sem tom. Até mesmo você.
Uma senhora toca meu braço, eu estava na fila da lotérica:
-O senhor sabe me dizer se eles aceitam este boleto aqui?
-Eles aceitam tudo senhora...tudo, se tem dinheiro, aceitam, até dinheiro de prostitutas idosas, estelionatários ...
Espantosamente ela não percebeu meu mau humor e riu. A minha vontade é cuspir, mas me contive. Eu me contenho das maiores besteiras que tenho vontade de fazer. Quem fosse me ver por dentro, entenderia com obviedade minha delinquência educada. Creio que todos são. Mas se comportam ás vezes bem. Vez por outra alguém faz merda pesada. Mata, se mata, estupra, agride. São maquinas de fazer violência sem arte. Isso não me agrada. Tudo deve ter arte.
Para ser o pior, é preciso ter talento. Não gosto de grosserias sangrentas. Creio ser melhor fazer isso tudo por dentro. Na alma. Onde as marcas não aparecem a olho nu. Onde a dor é mais intensa. Os resultados custam muito para serem apagados, quando são. Onde a tragédia é verdadeira.
Houve tempo em que me dediquei a violência silenciosa. As pessoas estão sempre dispostas a revidar na mesma moeda. Isso não me interessava. Revidava em outro tipo de moeda. Entupia estudadamente as pessoas de mimos, carinhos, e depois sessava isso de forma abrupta. Mas apenas quando tivesse certeza que a pessoa estavam acostumadas e gostando disso.
Aí as coisas começavam a ficar interessantes. Somente pessoas com personalidade muito coesa, de certezas inabaláveis permaneciam tranquilas. Infelizmente a consciência joga contra as pessoas. E tudo que isso faz, é ativar nossa natureza mais limitada. Os sentimentos que não são coisas nítidas para nós.
Eu me afastei de tais praticas. As uso apenas como estratégia eventuais. Raramente se faz necessário. Mas dias sombrios, fazem atiçar o pior em mim. Olho para a senhora na fila do caixa. Não creio que vá durar tanto quanto ela. Eu espero que não. Mas se durasse eu gostaria de não encher o saco de ninguém com perguntas tolas. Possivelmente eu ficarei encerrado em casa saboreando minha própria merda homeopaticamente.
Fila infernal. Não posso desistir, é preciso pagar tudo. Ali pagava com minha consciência mergulhada nas trevas de um dia sombrio. Quando finalmente sou atendido e pago. A moça do caixa sorria para mim. É sempre ela que me atende. Pergunto:
-Porque você tá sorrindo?
-Hã ?
-Você me acha engraçado?
-Não...
-Então não tenho graça?
-Como assim?
-Esquece e tira esse sorriso idiota da cara.
Ela se cala, fica apenas me olhando. Aquilo de certa forma me fez bem. Algo aliviou meu coração. O dia continuava uma merda. Mas agora o problema não era mais meu.

Luís Fabiano.
A paz é um sorriso oco.

sexta-feira, setembro 03, 2010


Elas vêm

De uma a uma
Duas a duas
Três a três
Ou mais
Cheias de promessas vazias
Que acreditam como não acreditam em nada
Sorriem e ficam bêbadas
Trepam como qualquer ordinária
Dizem amor, amor
Fácil como vomitar
E tudo acaba
Acabam comigo e com
O irretornável tempo
Seu amor me mata
Elas estão felizes
Um abraço aqui
Um beijo ali
Eu pensando se mato ou não
Uma barata

Luís Fabiano.

quinta-feira, setembro 02, 2010

Eric Clapton - Wonderful Tonight


Virtudes de areia

Marisa parecia perfeita demais para ser verdadeira. Tenho em uma percepção acurada da cretinice humana. Os semelhantes se reconhecem. Quando nos vimos á primeira vez sorria com graça e suavidade, gestos quase ensaiados.
Muito bonita, gosto afinado, a voz metálica traduzia uma correção que me causava engulho. Nossos santos não se “bateram” logicamente. Normalmente iria ignorá-la. Por todos estes fatores, e mais o que a acompanhava. Um marido forte.
Nesta época gostava de confusão. Dizia a plenos pulmões que esperava que minha vida fosse um caos. Com o tempo o caos me encontrou. A simplicidade de tudo parecia desaparecer.
Não era, mas aos poucos foi tornando-se. Com as merdas existências, você aprende, que é preciso domar vulcões, acariciar maremotos e trepar quando um terremoto sacudir a sua cama.
E por uma destas fatalidades do destino. Marisa veio trabalhar comigo. Então você duvida que o diabo esta a espreita? Estava disposto a colocar suas virtudes a prova. Na ocasião que fomos apresentados, apenas um olhar gateado, ela se traiu.
Tudo que se precisa, é que o tempo trabalhe. Fui sutil. Não fui mostrando as armas assim repentinamente. Até mesmo porque ela não era o tipo que me atraia. Esperei a confiança vir. Tornar-me amigo. As confissões entre amigos.
Naquele instante existencial, eu estava na minha segunda separação. Tinha animo e liberdade para ser um canalha a vontade. Tentações existem. Alguns vícios são latentes. Eu não era tentador, nunca fui mas também não tinha nada a perder.
Um mês depois de convivermos, sabia quase tudo se sua vida. Até mesmo do problema de humor do marido, suas ausências intimas e do pau pequeno. Era muito educado na frente de todos, a tratava com todo respeito na aparências. A vestia como uma Barbie. Porem quando entravam dentro de casa, acabava a encenação. Conheço muita gente assim.
Não preciso dizer que fiquei deliciado com a desgraça que cada um leva em oculto. Isso fazia lembrar das minhas próprias. A sensação de não estar errado realmente me excitou.
Então o cara não passava de um filho da puta. Com uma mulher bonita, que até ali era a pedra angular da virtude feminina.
Creio esse ser o maior problema das convivências. Tudo que vemos é uma ilusão criada por ideias sublimes ou terríveis. Porem com o tempo tais ideais vão diluindo-se como gelo no verão. E em poucos instantes, tudo converteu-se em um nada raso. Destas coisas vulgares que somos feitos eu e você.
Os dias passaram céleres. Marisa de mármore de Carrara, converteu-se um basalto, depois e numa rocha vulgar, no final não passava de um tijolo quebrado. Creio que a coisa que mais acho odiosa é exatamente isso. Ela foi ficando comum. Sem o brilho de minha mente, o lustre de minhas idéias, ela não passava de uma mortal.
A maior briga humana é exatamente essa, desmistificar seus ídolos ,sejam eles quem forem. Perceberem que tudo não passa de um brilho que a maioria das vezes lhes emprestamos.
Um dia, ela passou perto de mim, minhas mãos roçaram parte de seus seios.
-Opa, desculpe, foi sem querer...
-Tá tudo bem.
-Marisa, não foi sem querer...
-Tá brincando né Fabiano?
-Não. Falo sério.
-Tudo bem, mesmo assim estás desculpado.
-Desculpado? Você deveria dar um premio... tocar nestas tetas horríveis...
Começamos a rir. Mas uma brincadeira tão ingênua releva falhas, ás vezes vontades. Diante de um toque muitas coisas acordam, inclusive as ruins. Ela sorria bonito quando era natural. Sem aquela plástica que usava para parecer tão respeitável. As tetas eram boas.
No dia seguinte ela chegou triste no trabalho. A tristeza de alguém sempre é a felicidade de outrem. Certamente as grosserias de Nestor devem ter passado da conta. Esse cara merecia vários pares de chifres. Para ele, Marisa não passava de sua propriedade. Um móvel. Ele esqueceu tudo ou nunca sequer pensou nisso. Detesto esse tipo. Costuma ser aquele passional idiota, que irá matar, esfolar, enforcar e depois se mata quando traído. Os amores dos tempos hodiernos. Matar-se por amor? É bonito, mas creio que Marisa não seria a pessoa que me faria fazer isso.
A abracei e ela chorou. Estávamos sozinhos na sala. Ela repetia a ladainha:
-Não aguento mais...não entendo porque ele age assim...
-Marisa, não tem o que entender. A maneira dele gostar de ti é gostando de si mesmo.
Ela me olha terna, não resisto e a beijo. Ela não resiste nada. Mal sabia que as suas dores poderiam aumentar e muito.
Passei a ser seu “consolo” nas horas difíceis da vida. Na continuidade ficamos mais íntimos. Transar com ela foi bom, porem longe estava de ser a melhor trepada de minha vida. Era passiva demais, sem atitude, esperava os carinhos gratuitamente. Sem mordidas ferozes, Isso me causa enfado. Gosto das agressivas, que vem pra cima. Que berram, que choram, que xingam com palavrões.
Ficamos nisso um bom tempo. Mas Marisa continuava submissa ao marido, que um dia lhe tirou do emprego. No dia final ela me abraça e se despede chorando. Chorava demais. Dizia que seria difícil nos vermos, mas as vezes, bem as vezes talvez...
Não senti falta dela. Na verdade facilitou meu trabalho. As tais despedidas são sempre cheias de dramas. Não sentia amor ou mesmo gostava dela o suficiente para sentir falta. Aquele era um autêntico caso de amor comigo mesmo. Com meu ego, com minhas tolices e algumas vaidades. Marisa era apenas um catalizador daquilo que tinha de pior.
Depois dela vieram outras. Menos ostentosas, porem com grande disposição para o pecar com a alma. Brutais e lindas e que ainda assim pouco acrescentaram. Sempre quando olho uma nova xoxota, fico perguntando para ela mentalmente: Ei, que você tem a me dizer? Fico olhando aquele buraquinho escuro vermelhinho, em alguns caso o buraco é considerável.
Que será que irá sair lá da próxima vez??

Luís Fabiano
A paz é um buraco escuro
.