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sexta-feira, abril 22, 2011


Uma conversa

Manoel Magalhães*

- Caro mestre, que faço para escrever bem?

- Escute o zumbido das abelhas, o pisar suave das formigas na terra úmida, o esvoaçar do pássaro entre nodosos galhos...

- Só?

- Não. Preste atenção à melodia do vento na copa das árvores, o sussurrar dos córregos em contato com o leito, a maciez de um beijo...

- E isso basta?

- É preciso mais... Como entender a linguagem do coração, desvendar a fome da alma, compreender a rebeldia dos sentimentos, a intrepidez dos nervos...

- Não conseguirei.

- Conseguirás, sim, pois a luva ajusta-se à mão, os olhos à visão soberana. E o paladar à tenacidade da pimenta e à doçura do mel.

- Amar resolve?

- Sim, sobretudo se teus ouvidos ouvirem a melodia das curvas de um corpo, teu olfato apreender o significado dos cheiros que dele exalam e tua vontade sobrepujar a vontade do outro que, movido pela paixão, deixa-se escravizar.

- Que Deus tem a ver com isso?

- Tudo e nada. O tudo significa o todo, o nada remete ao vazio.

- Acho que não conseguirei?

- Conseguirás.

- Me aponte o caminho?

- Vês o abismo que se estende à tua frente?

- Vejo.

- É o caminho.

- O abismo?!

- O próprio.

Manoel Magalhães é jornalista e escritor.


2 comentários:

Anônimo disse...

Me faltam palavras para traduzir isso. Sei lá... O cara é fera. Me lembrou os textos de o Profeta...

Cris

Anônimo disse...

Ele tá mais pra profeta do apocalipse, não se enganem.