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sábado, maio 08, 2010


Dia das Mães (uma cadela)

Não é de hoje que digo, que qualquer ser humano que se prese tem pelo menos duas mães. A mãe que da a teta gostosa para seu filho, cuida dele, e outra que vem a aparecer quando nos tornamos mais ou menos adultos, a puta.
Sempre bradamos para nossos amigos, ai seu filho da puta, tudo bem? Ele sorri contente e nos devolve o elogio. Essa é a mãe da rua, não menos adorada que a de casa, os árbitros de futebol que o digam!
Tudo isso é poesia simbólica, boa e fácil de contar. Isso me faz lembrar o grande Nelson Rodrigues que dizia: “até uma cadela quando procria, torna-se melhor.” Mas infelizmente nem todas as cadelas ficam melhores, nem todas...
Na manhã daquele domingo, Marina olhava seu bebê dormindo suavemente. Fazia horas que Marina estava com sua mente meio perturbada, olhava aquela criança não como teoricamente uma mãe normal deveria olhar.
Naquele instante para ela ,a criança representava a castração de tudo que sempre almejara, estudar, formar-se e depois quem sabe casar e ai sim, ter filhos.Mas os hormônios falaram mais alto, desejo e tesão chamado de amor.
Mas nem sempre a vida gosta desta ordem tão limpa e perfeita que gostamos de idealizar. Alias pouquíssimas coisas na vida são tão limpas. De minha parte pessoal, detesto esta maneira inocente e ilusória, como as pessoas observam a vida. Os puros e limpos , sofrem muito por sua tolice.É inescapável.
Marina contava agora com dezoito anos, simplesmente não conseguia sentir felicidade,mesmo quando seu filho sorria.Não via poesia nisso, achava um saco.Lembrava-se, tentou fazer aborto, tomou uns remédios,mas por aqueles mistérios que nem Deus explica, o remédio não fez efeito.
Sua mãe muito positiva dizia com toda a classe que o mundo permite:” se sabe abrir as pernas, é porque sabe cuidá de filho também...”
Não preciso dizer que Paulo, o namorado de Marina, quando soube do ocorrido, desapareceu em uma noite, dizendo adeus e sorrindo pra ela. Ela o esperou no outro dia, e no outro dia, e no outro dia, o telefone ele não atendia e fim. Marina sozinha com uma barriga, querendo matar aquela criança, pensava:” porque essa merda não morre em mim?” Havia dor demais e pouco espaço dentro de si, saudade de Paulo, abandono de Paulo, uma criança, um peixe dentro de si, tentando virar gente, tentando sobreviver no mundo, quem sabe ser feliz um dia? Talvez crescer e ter sonhos.
As condições não eram as melhores, Marina não trabalhava, na casa pobre, eram sua mãe, e seus dois irmãos mais novos e o filho que chegara agora a dois meses. Sua mãe dava trabalhava em casa de família, fazia comida, limpeza e essas coisas, saia pela manhã e voltava tarde da noite, muito cansada e sem paciência.Na sua cabeça, achava que a filha tinha cometido um pecado mortal, embora ela mesma tivesse feito o mesmo na mesma idade.A diferença que seus pais envergonhados, conseguiram fazer o aborto e a felicidade voltou para o lar, limpo da vergonha, apenas com um pouco de sangue fetal nas mãos.
Tudo era desespero, Marina não tinha mais tempo de nada, quando acordava cedo e seu filho estava dormindo, ficava pensativa e cheia de arrependimento, ressentida, lembrava-se da noite que transou com Paulo, aquilo parecia um sonho que lentamente foi convertendo-se em pesadelo.
Seu olhar ficava olhando o vazio, como querendo voltar no tempo, o tempo não volta. Quando se precisa ter esperança, parece que ela insiste em fugir para longe de nós. Olhava-se no espelho sentindo-se horrível, nem Paulo e ninguém mais iria olhar pra ela.
A televisão ligada, passando propagandas repletas de um mundo que não era seu: compre seu presente pra pessoa que mais te ama? Ela esta sempre junto de você? De carinho a quem te deu a vida?
Que tudo aquilo significava?
Quando olhou seu bebê a única coisa que sentiu foi raiva, a criança não representava a esperança de sua vida, era a tragédia de seu viver, representava sua burrice, o erro, como ter amor pelo erro?
A criança dormia inocente a tudo isso, ressonava talvez sonhando com sua mãe. É nestes momentos que o ser humano prensado contra uma parede afiada, toma decisões extremas, salva sua vida ou termina por destroçá-la definitivamente.
Quem a salvaria naquele momento?
A propaganda imbecil da televisão?
Deus em pessoa desceria do céu?
Uma mão amiga apareceria do nada?
Sentia a solidão pior das solidões, a que te empurra para o abismo. Não estava louca, apenas sentia tal pressão. Levantou-se pegou o bebê que dormia na cama improvisada, segurou no colo, não sabia o que fazer, mas queria fazer alguma coisa. Teve a idéia de afogá-lo na privada, foi até a privada imunda que fedia a mijo e merda, a criança ainda dormia,então foi a aproximando o bebê da água podre. Como se pressentisse a hora da morte, a criança começa a chorar, um choro profundo lancinante, choro de cortar a alma.Marina pára. Sente-se desencorajada, a criança berrava a plenos pulmões. Esse era o milagre.
Não era preciso nada miraculoso acontecer, bastava o choro desesperado do pequeno Vitor, devolveu-lhe um pouco a humanidade, ás vezes as coisas são por um triz. Talvez porque aquele domingo fosse o dia das mães, o primeiro dia das mães de Marina.
Talvez se arrependesse e tentasse novamente, mas por agora não.

Feliz dia das Mães.
Luis Fabiano.

Um comentário:

Anônimo disse...

...As vezes ser mãe caracteriza só mais uma etapa da vida, concordo com os pensamentos de Marina, se verídicos ou não, ficaram bem colocados no texto, por vezes a maternidade nos assola e não estamos preparadas para isso,para se criar filho sozinha temos que tirar força de onde não temos, nos tornamos responsáveis por alguem, temos q cuidar, dar afeto,atenção, quando tudo o q queremos é que o mundo nos note e nos devolva um pouco disso .Pura ilusão, ser mãe é lindo teoricamente falando, mas qdo nos deparamos com o compromisso que isso implica, eu creio que gostaria de ser apenas filha, incondicionalmente amada e cuidada por alguem que me aceita como sou, qdo os papeis se invertem aí o bicho pega! Se não bastasse isso, somos responsabilizados por tudo que os “pestinhas” aprontam, geralmente erros apontados por pessoas que nunca tiveram seus próprios filhos e as pessoas cochicham” olha q criança mau-educada e a mãe não faz nada.... Oras, no mundo de hj onde dar uma palmada em uma criança torna caso para “Conselho Tutelar” fica bem complicado ser mãe, mas desejo a todas que tentem dar o melhor de si um dia quem sabe, tenham motivos reais a comemorar.
Adriani