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terça-feira, dezembro 27, 2011



Cadáveres felizes do verão

Tive profissões terríveis
Difíceis de digerir
Auxiliar de legista, limpar o pior a merda e o sangue
Fica-se muito sujo
E os olhos anseiam a luz do sol

Com o tempo a barata existente em nós se acostuma
Ficamos resistentes ao pior
Músculos da alma tornam-se fortes
E respiramos o ar pútrido com serenidade angelical
Chamam isso de céu as vezes
Afinal não é onde você esta,
Mas como você se sente... as vezes...
Com o tempo os cadáveres se tornaram simpáticos
Como rosas secas abandonadas em um vaso

Oferecíamos lhes o sanduiche e um refri... ou vodca
As vezes aceitavam seriamente
E a morte se tornava uma piada
Até que Ela apareceu...
Havia morrido de câncer
Mas não parecia morta... gostosa como uma viva
Seios grandes e cara de anjo e sem pelos...
Olhamo-nos todos com cumplicidade erótica silenciosa
Uma inegável ereção de cavalo em uma enfermaria de vidro

Então tínhamos que destrinchar aquela carne nua
Tornar horrível o que a vida havia presenteado de esperanças
Não parecia justo ser instrumento do mal
Na indiferença da morte presente
A vida etérica pulsando nas dobras residuais do passado
Pensei em trepar com ela... encher-lhe de vida com a minha porra
Congela-la na intimidade do meu coração
Captura-la como se prende o voo do beija-flor

E mesmo enrijecidos na indiferença da morte
O arroz e feijão de todo dia
Aquela morta mais linda que muitas vivas nos arrebatou
E uma piedade nasceu em meio a escuridão
A frincha de cachoeira indiferente da natureza
E cada corte que fazíamos nela
Era como uma oração a uma santa que não existe
Naquele dia resgatamos nossa alma um pouco
Os bisturis e agulhas não eram para ferir ninguém...

Luís Fabiano.

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