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terça-feira, março 01, 2011


Porra de Aluguel...


Arrastado por milhares de pensamentos desconexos, assim fico ás vezes. Nunca fui muito bom com a ordem das coisas. E com o tempo, tudo foi ficando mais claro, pela minha profunda indiferença as coisas bem feitas, ordenadas e precisas.

Por momentos me abandono assim, e mesmo com o caos muito presente em minha vida, sinto-me em paz. Creio ser esta a chave. Se você consegue ficar bem, mesmo que tudo a sua volta não esteja bem, das duas uma: você ficou louco ou alcançou um estado de serenidade perene. Isso não me interessa definir, eu prefiro apenas sentir como sinto, que seja por instante, mas que seja.

Em alguns poucos momentos depois, me casei de tais pensamentos. Sou exatamente assim, cansar-me é muito fácil, canso de mim, canso das pessoas, canso de pores do sol ou luares espetaculares. Canso da merda toda. Resolvo sair de casa. É uma boa hora, 1:47 da manhã. Olho pela janela do quinto andar, a rua deserta em uma segunda feira, sonhando em virar terça feira. Noite agradável, temperatura certa, sinto minha boca seca, uma cerveja solitária seria bom. Não fico titubeando e saio.

O motor do carro ronronando lentamente, então vou olhando puteiros e bares que como paradouros de vampiros. Ficam pendurados nas portas, fumando e bebendo tentando sugar um pouco de vida para dentro si. A cidade agora é uma pintura congelada. Depois de rodar um pouco, acabei parando em um bar no final da Barão de Sta Tecla.

Era uma porta aberta com uma luz avermelhada, não havia nomes. La dentro umas poucas presenças, putinhas tentando fazer seu joguinho de sedução por uns quarenta reais, poucos clientes e o segurança mal humorado.

Essa noite eu não queria putas. Queria apenas respirar o mesmo ar daqueles que desejam a vida, pelo desejo de encontrar-se com ela, de querer usufruir ou ser usufruído, que tentam sobreviver entre o esgoto e as estrelas, bêbados, drogados, tarados ou insanos. Eis os verdadeiros heróis. Bom ter um pouco de cada um.

Sentei-me junto ao balcão do bar, altar de sonhos e decepções, a cerveja veio com a má vontade do atendente. Queriam que eu fosse embora ou melhor, que eu não tivesse entrado. Tomei a cerveja lentamente, olhando com sarcasmo. Por estes mistérios da vida, encontrei uma velha amiga, que pelo andar estava em franco declínio. Não me impressionam estas coisas, afinal essencialmente somos ossos e vermes que dançam. A derrota nem sempre é tão mal.

O tempo havia destruído Stela. Quando me olhou nos olhos me reconheceu:
-Fabiano? É tu mesmo... ?
-Claro Stela, a uma hora destas, só pode ser eu...

Nos beijamos como nos velhos tempos. Porem hoje faltavam dentes em sua boca, um dente inferior frontal. O cabelo algo descuidado, e o ar cansado falavam silenciosamente de uma vida difícil. Ganhar a vida como puta, não é fácil, ela já era da profissão a muito tempo. E posso dizer que, não era uma puta de alma. Fazia para sobreviver, conhecia truques para os clientes gozarem rápido e irem embora mais rápido ainda:

-Que fazes por aqui ? Veio, brincar...hummm hummm (disse isso pegando no meu pau)
-Não, não hoje queria beber uma cerveja apenas e talvez conversar...
-É ? Já vi que tô fudida contigo né? Não vai rolar nada...me empresta dez reais?
-Empresto...mas cobro com juros viu...

Dei o dinheiro e ela desapareceu alguns minutos e voltou com os olhos brilhantes e limpando o nariz. Havia dado um teco em algum pó vagabundo que se vende na cidade. Agora, tinha ares mais animados. Uma certa tristeza havia desaparecido, dando lugar a vencedora no mundo.
Sorri pra ela.E Stela me pergunta?
-Gostou né ? To linda, não tô? Diz...
-Stela não faça perguntas difíceis em uma hora dificil...
-Eu sei que to...sabes eu tenho lembrado de ti né...queria que tu me ajudasse em uma coisa aí...
-Comprar mais pó??
-Não, fale assim baby querido...não nada disso...coisa séria...to pensando em mudar de vida sabes?

Aquilo me fez rir com vontade. Mudar de vida? Desde que a conheci sempre foi assim. Eu entendo que mudar algo que se é em certa altura da vida, não é viável. Se você é um desgraçado, seja-o e viva tranquilo, execute seu papel na vida. Muitos não sabem o papel que tem na vida, ficam perambulando para todos os lados, sem repostas.

Não acreditava em uma única palavra que ela dizia. Tenho isso em minha personalidade, eu não creio em nada ou ninguém que fala. Prefiro que a vida e as ações concretas sejam como inegáveis provas, com quem não duvida nunca de uma tempestade chegando, como o gosto do mel, como as lágrimas da saudade, como a anestesia para dor.

-E mesmo é ? Bem vamos ver minha linda...diz aí tua letra...e vemos....
-Sabe eu sempre quis ter um filho...e nunca tive o momento certo...e acho que agora estou em um bom momento na vida sabe...to feliz...as vezes ganho uma grana por ai...
-Sim, Stela...sim...mas e onde eu entro nisso?
-Assim Fabiano...tu não queres ser pai de um filho meu? Tu dá uma daquelas gozadas que tens com bastante porra, bem no fundo dentro de mim...hein ? que tal ? Eu mãe ? Não seria Legal??

Aquilo estava piorando francamente. Stela é uma daquelas putas que se precisa transar com sete camisinhas...a primeira coisa que pensei. As drogas estavam fritando os últimos neurônios dela. Gostava de Stela, mas a distancia. Fiquei imaginando como seria aquela vida de pai de filho de puta. Bem, o garoto ou garota nem poderia se ofender, se o chamassem de filho da puta...comecei a rir:

-Olha Stela, creio que eu não estou pronto para ser pai. Nem sei se nessa vida estarei. Acho que não...nem você...

Pensei comigo se seguia dizendo o que estava pensando...o pensamento original era dilacerante, uma navalha a procura do osso, um empurrão para mais perto do abismo...creio que Stela não precisava ouvir, tudo já era tão difícil. Todos sabemos como é duro mudar, como é penoso ás vezes olhar para as próprias feridas, não queria fazer mais mal.

Como aquilo que não disse, Stela fica me olhando em silencio. Talvez tenha entendido, talvez tenha visto tudo. O brilho dos seus olhos, ainda estava ali, como estrelas mortas que vemos no firmamento, que estão a anos luz de nós, que não existem mais, apenas o seu brilho final ainda não chegou.

A trouxe para junto de mim e apenas a abracei. Não sei o quão era alucinante o seu sonho, o quanto as drogas haviam deformado suas percepções, mas algo lhe doeu. Nossos sonhos misturados ao nosso lixo. Notei que ela secou algumas lagrimas.
Minha cerveja havia acabado, eram agora 2:47, era melhor eu me recolher. A beijei suavemente, ela me olha:
-Volta aqui tá? Aparece aqui...aparece....

Entrei no carro, fiquei uns minutos pensando, pensamento que lamentava, talvez por minhas próprias dores, por tantas coisas que ás vezes se pensa em alcançar, como a paz que escapa batendo asas.
Senti saudade de um pouco de ordem, e sobriedade. Queria dormir tranquilo e não ter sonhos complexos e amanha, quem sabe acordar. É bom acordar.

Luis Fabiano.

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