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sábado, dezembro 19, 2009

Pedro, não chegou a tempo.

A vida é implacável para quem é mole demais. Não se pode aliviar, ter emoções é sempre uma lamina de dois gumes. Mas eventualmente é preciso arriscar, acreditar em alguém, em alguma coisa, é importante, mas sem abuso.
Quando conheci Pedro, depois prestávamos o serviço militar. Aquilo era uma merda, mas fortalece amizades verdadeiras. Isso realmente é bom, saber que não vais te foder sozinho, inspira, nos torna unidos e corajosos.
Para mim o quartel foi muito bom neste sentido.
Pedro era um tonto, atrapalhado mas uma pessoa boa, tinha sinceridade no olhar, seus olhos brilhavam.Éramos ambos estranhos, muito diferentes um do outro, talvez isso fizesse que sempre estivéssemos conversando.
Contávamos nossas experiências, era muito bom.
Certa vez me contou que tinha uma vizinha apaixonada por ele. Mas não queria saber de paixão, de amor e essas porras todas, dizia:
-Quero ficar livre, comer todas as bocetas possíveis do mundo!!Todas, ai quando eu cansar disso, caso com a vizinha, ou alguma outra mulher apaixonada. Sempre tem uma puta apaixonada!!Elas vivem pra isso.
Gargalhava alto, com um fuzil na bandoleira,apontado para as estrelas.
Eu achei graça daquilo, com dezoito anos, não queria compromisso nenhum, muito embora já estivesse namorando muito sério. Alias sério demais, por isso que não deu certo. Não iria discordar de Pedro, ele parecia feliz assim. Nunca gostei de cortar os baratos dos outros, ainda que tudo levasse a uma merda qualquer, você é livre, faça e assuma, se tiver culhões.
Servimos juntos durante nove meses, sempre tirando guarda junto, eventualmente conseguíamos uma cachaça, cerveja para tornar, tudo mais interessante, nunca acontecia nada nas guardas.Era um saco.
Nenhum assalto, nem uma tentativa de roubo nada.
Quando demos baixa do serviço militar, nunca mais nos falamos, agente perde o contato, é normal. Pedro é um grande amigo. Mas o tempo é inexorável.O outro lado da lamina.
A duas semanas atrás eu o encontrei no calçadão, dezenove anos depois.Continuava com a mesma cara, mas reparei seu olhar, seus olhos. Algo havia se apagado. Pensei comigo, sofrimento por vezes vai lentamente nos abatendo, como uma fera apartada do seu habitat natural, vai se tornando triste demais as vezes.Tome muito cuidado com tristezas excessivas,elas podem deformar nossa visão da vida.Quando for demais faça alguma coisa urgente, qualquer coisa.
No papo vai e papo vem, perguntei :
-E ai Pedro, ainda comendo tudo que é boceta por ai?
Ele sorri amarelo, percebo que fiz uma pergunta errada. Agora já era tarde.
Nos sentamos nos bancos de cimento do calçadão, ele diz:
-Cara, quanta merda é possível fazer na vida?
Achei a pergunta engraçada, respondi rindo: Infinitas eu acho, sempre é possível fazer algo pior.
O seu rosto sério concordou, confessou:
-Tu lembra que eu dizia, de uma vizinha minha que era apaixonada por mim?
-Sei claro, tu debochou que sempre tem uma puta apaixonada.
-É isso mesmo. Só que eu cometi um erro cara, o tempo passou, tudo virou, quem ficou apaixonado, amando mesmo fui eu.
-Como assim Pedro?
-Assim mesmo Fabiano. Passei saindo com tudo que era mulher, até com ela, mas a Patrícia era uma mulher muito parceria mesmo. Mas eu não via isso. Eu queria era frescura, uma transa eventual e nada mais.
-Sei, eu acho isso normal, fui e sou assim.
-Cara, tu ainda ta na adolescência?
-É, talvez,mas não caio de paixão por nada,para isso acontecer tem valer muito a pena correr o risco Pedro, do contrario, nada leva a lugar nenhum.
-Bom Fabiano, quando me dei conta, a Pati parou de me ligar, me procurar, achei meio estranho, achei que ela tivesse menstruada,sei lá.Muda o humor NE?
-É, em alguns casos.
-Mas nada disso amigo, ela tava saindo com outro cara. Quando fiquei sabendo e vi, me deu um aperto estranho no peito.Desconforto.
-Que papo é esse Pedro?
-Sério cara. Tentei ignorar, fazer de conta que não tava acontecendo nada. Mas não dava, a Pati vinha na minha cabeça, ela abraçada naquele cara? Pô, ela era minha cara. Só sei que tudo foi ficando pior, fui falar com ela, resolver isso de uma vez, assumi-la como minha namorada e deu.
As vezes, é preciso perder para dimensionar a importância em nossa vida. Os machões querem dominar a mulher ainda hoje. Pedro brigava consigo mesmo, pela sua surpreendente descoberta.
-E ai Pedro, que deu?
-Disse pra ela: Pati, eu te amo,sério mesmo, agora eu vi isso, Pati.Vamos fica juntos, descobri que te quero. Ela me olhou cara, tirou a minha mão das mãos dela, me olhou fundo nos olhos, seria e disse: Pedro, não dá mais. Fiquei muito tempo te esperando, eu te amava, tu nada, nem atenção me davas.Eu conheci o Osvaldo.Ele teve uma paciência enorme comigo, ele sabia que eu te amava.O tempo passou Pedro.Hoje tu te transformou em um amor que tive na infância.
Ela terminou dizendo: Pedro, tu perdeu tempo demais, agora tu perdeu.Tchau.
Os olhos dele estavam marejados na narrativa. Era drama na carne. Eu não queria ouvir mais nada, nem Pedro falar. Ele olha no relógio, como quem quer voltar no tempo. Dei-lhe um abraço. Foi embora para não se atrasar, o tempo agora era algo muito importante.

A paz nos ponteiros da vida.
Luis Fabiano.

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