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quarta-feira, novembro 16, 2011


Carinhos de um Porraloca


Parte 1

A memória é uma espécie de anjo e carrasco, acentuando e cravando suas garras em nossa existência... ora catapultando para um paraíso sereno e doutras vezes, transformando-se em um cárcere lubrificado, de nossas merdas eternas.

Apegar-se a memória de qualquer forma, é estar preso. E dia após dia tenho me livrado disso. Merdas demais, pesam em algum lugar em mim... para além dos intestinos. Então como um saco de tijolos, vou deixando para trás tudo. Ando mais tranquilo, ainda que as estradas estejam com uma paisagem lunar.

Sim, talvez a paz seja um pouco isso, permitir abandonar-se e abandonar o pior que temos. Mas sempre resistimos largar o pior, preferimos a tortura, a ferrugem de nossas engrenagens carcomidas, é o orgulho tramado em nossas ações melhores e piores... a mesma ferrugem que irá corroer nossa engrenagem... e vamos dar diversos nomes depois... mas não importa, irá doer da mesma fora. Fantástico humano !

Quando conheci Daniel, não entendia muito sua maneira de viver... nem tão pouco como vivia... de onde tirava grana. Tudo era e é um mistério. Existem coisas que as vezes é melhor não saber. Isso é uma verdade, jamais queira mergulhar nos detalhes sebosos da vida alheia, isso geralmente nos joga em uma zona de entendimento, porem é melhor que mantenhamos a distancia. Remexa apenas o seu próprio caldeirão asqueroso de podridão. Relaxe, todos nos temos merdas em nossas vidas... não há surpresa no ser humano.

Nesta época eu era casado com uma mulher que quase não era uma mulher. Ter tetas bonitinhas, xoxota e longos cabelos não determinam nada. Um dos casamentos mais insalubres que tive. Tive muitos. Ela não era dada a carinhos, nem me chamava de meu amorzinho e nada parecido. Nos fazíamos sexo as quartas-feiras... e nossa vida não tinha nada de muito interessante, enfadei-me rapidamente.

Um trem nos trilhos e com algum equilíbrio. Isso é desejo de todas pessoas... é disso que justamente eu fujo. Tal equilíbrio é mortal, é uma paz emulada, um lodo silencioso e calmo... para se suportar, mas não queiram mexer. Ela parecia feliz, era tudo excessivamente normal... ela decidia tudo, inclusive a foda... como eu disse, ela não precisa de mim, precisava de um vibrador.

Mas mesmo assim, quando fui embora, teve drama ridículo de orgulho ferido e quebra-quebra, ação ao final nos estertores do espetáculo... o ser humano é previsível como um peixe no aquário!

O Daniel frequentava nossa casa, nos frequentávamos a casa dele. Éramos bons amigos. Era interessante, um bom sujeito, um cara que era apenas cruel consigo mesmo. Conheço esses tipos. Caras que se agridem ao limite de tudo. Muitas bebidas, drogas diversas, relações tumultuadas com diversas pessoas e brigas com desconhecidos.

Um trem em uma floresta negra, arrastando toneladas de disposição, uma disposição catastrófica. Gostava dele, como gosto de tornados, de relâmpagos, gosto de tempestades e chuvas que não sessam, ventos que arrastam tudo no seu caminho. Gostava de Daniel por isso.

Um dia fomos apresentados a sua ex-mulher, e mãe de seu único filho. Quando conheci Geórgia, logo entendi tudo. Uma beleza inacabada. Os desgraçados se encontram nas encruzilhadas da vida, se unem e vão adicionando força ao inferno sorridente.

Ela era bonita, gostava de roupas decotadas, muito embora não tivesse na melhor forma. Um longo cabelo preto, olhos claro, sorriso fácil e um olhar perturbado de cheiradores de cocaína. Isso fazia dela um espécime a beira do abismo, beleza e medo, tragédia e sorriso. Belas tetas. Meu olhar mergulhou para o decote dela e não fiz muita questão de disfarçar. Daniel não se importava com nada, minha mulher preocupada mais com as aparecias das coisas, sorria como uma cadela feliz, quase latindo de uma forma mais educada possível. Ela tentava ser o maestro de uma orquestra no manicômio.

Daniel e Geórgia viviam brigando abertamente, embora separados, se agredindo literalmente, quando as oportunidades surgiam. Belas feras. Ambos ficavam doidões, com qualquer droga e quebravam a casa toda... imitavam a desgraça da miséria, embora tivessem alguma grana.

Eles eram o contraponto do meu casamento apagado em trilhos abandonados do silencio. De certa forma sentia um pouco de inveja da desgraça alheia... ao menos algo acontecia ali. Ate bati uma punheta para mulher de Daniel. Nada de gozadas programadas da quarta-feira no meu casamento... uma trepada que durava dez minutos ?? Terrível!

Mas a vida não se preocupa com a desgraça que todos arrastamos. Nem Deus ou diabo. E tudo mais ou menos por nossa conta, nossas intenções são como tentáculos intestinais estendidos ao nosso derredor, e ás vezes alguma coisa da certo.

A natureza esta cagando para nós, como as coisas vão se dar em nossa vida, e ainda que respeitemos a natureza de uma forma emulada, ela nos fode hoje ou amanha... basta esperar, quando começarmos a feder infectos, com a morte dentro de nós.

Geórgia engravidou, com a pior das possibilidades naquele instante...


Continua...

Luís Fabiano.

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