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segunda-feira, maio 23, 2011



Véu de risos e lágrimas

A ignorância é uma benção. O denso véu que descemos sobre nossa vista no afã de que, limitando o espaço da visão consigamos perceber, a felicidade em algum canto esquecido. A bem da verdade, é mais fácil mesmo, não dê muitas expectativas a alguém, coloque Deus como causa e final de tudo em sua vida e pronto.

Não tenho problemas com religiões, porque tal assunto não me interessa, creia em qualquer coisa e a vida acontece, coloque sua fé em alguma coisa, qualquer coisa, e dará certo. Deus não se preocupa com isso, assim como a natureza. Apenas acredite com as veras da alma, a única coisa que conta.

Encontrei Eduarda no calçadão dias atrás, estava transformada não só fisicamente, a alma adulterada, um ferro que se retorce ao calor, os cabelos compridos, e a roupa que agora escondia as suas voluptuosas formas, sopro de pecados escrito no corpo bonito.

Pois certas formas só lembram o quanto queremos consumi-las, só despertam isso, o poço dos desejos despidos, a provocar o demônio que carregamos em nós. Disso é feito o mundo, todos querem atiçar demônio de alguma forma, querem ser desejados por todos, que suas formas brilhem mais que suas almas, que as tetas e a bunda, sejam incandescentes como a caldeira do diabo, para que os anjos esqueçam as preces, o Criador e todo o resto.

Meu olhar clínico não erra, ela havia se convertido, mas três em meses ? A vida é realmente estranha, de um segundo para outro nada mais é igual. Confesso que me sentia desapontado, pois Eduarda era uma mulher atraente, chegamos a ter nada serio brevemente.

Ela vivia preocupada, com trinta anos, tudo lhe era preocupação demasiada, uma excessiva alucinação existencial de ansiedade. Uma vez até falou que sentia vontade de morrer, que não tinha esperanças em nada. Tentava persuadi-la, que estava exagerando na maneira que estava percebendo a vida. Nada é tão extremo sempre, entre uma merda e outra da vida, conseguimos respirar, e alguns chamam isso de felicidade. Mas ela não acreditava em mim, não acreditava em nada e ninguém, falava que talvez tirasse sua vida, era como se não tivesse dito nada.

Um dia sugeri que não perdesse tempo pensando como, que realmente fizesse isso, milhares de pessoas fazem, e são esquecidas no anonimato de um silencio da morte. Afinal morte é morte, seja dormindo em casa, ou saltando de um prédio, uma pandorga sem cordas que não plana, que mergulha, mergulha, mergulha...

Não fez nada disso. Estava vivinha, tinha um olhar confiante como nunca teve, e uma bíblia nas mãos. Sorri pra ela, cumprimentando-a parando:

-Eduarda, tudo bom ?
-Oi Fabiano, tudo em paz graças ao Senhor...

Como uma pedra no feijão, engoli aquilo, tentaria fazer o possível para não provocar nada, tentar sair ileso de uma discussão, carregando meus pecados para longe solitariamente, os crentes não gostam de mim, já tive experiência disso.

-Que bom Eduarda, eu fico feliz de te ver assim tão bem...
-Estas debochando de mim né?

Puta que pariu, começou.

-Não Eduarda, tu estas diferente e quero crer melhor...
-Certamente Fabiano, o Senhor me salvou, do pior, ao contrário de ti, agente do demônio...
-Calma Eduarda, tá tudo bem, tu não precisas te voltar contra mim eu apenas...
-Sei, o que tu és agora, o Senhor me mostrou, filho de satã...

Eu sabia que aquela puta arrependida, agora ovelha do senhor, ia fazer isso, pensei em ir embora rápido, mas algo em mim acordou do sono mórbido que vivo, realmente não dou atenção a isso, raramente digo alguma coisa de resposta, porque normalmente o tigre deve ficar quieto, é melhor:

-Tudo bem, Eduarda, sou filho de satã, agora vou te dizer uma boa, se não fosse o diabo, Deus não teria sentido algum, diga-se de passagem, dinheiro algum também né, então o diabo é um bom negócio pra Deus...

-Eu sabia, viu o satã fala por ti...
-Há um ano quando satã mamou nas tuas tetas, você não falou assim...
-Nunca mais me dirige a palavra, o meu Deus vai te perdoar, rezarei pela tua alma...
-Agradeço, mas meu caso é perdido, e tá bom assim...chata.

Foi embora sem tchau, adeus ou coisa alguma. O senhor havia levado a educação dela também. A sede de esperanças leva as pessoas a se converterem, acho isso bom, temos conversões para todos os gostos.

Eduarda não esboçou um único sorriso, a cara fechada para plasmar dignidade fabricada. Lembrei-me de Buda, Jesus, São Francisco e outros tantos. Cuja vida fantástica, marcada de fenômenos e coisas inusitadas e amor, porem não pareciam felizes, eram contrario, taciturnos, tristonhos, alguns alucinados preocupados em acabar com a dor da humanidade, sem um único sorriso?

Procurei textos que falassem de um breve sorriso de Cristo, de Buda, mas nada. Acho que um véu denso e invisível desceu sobre mim, minha solidão profunda e meus breves sorrisos, preocupando-me apenas com o próximo minuto de vida, uma tentativa de sorrir, de fazer sorrir a quem quer que seja, acho que me sinto bem assim, você tem um minuto?


Luís Fabiano.

Um comentário:

Dóris disse...

Será mesmo possível uma religião mudar tanto uma pessoa?
Bem, talvez o que algumas pessoas falam seja mesmo verdade, é preciso se encontrar né, talvez tua amiga tenha se encontrado, e encontrado a salvação com Jesus.
Sou uma reles atéia, ou atoa mesmo, não consigo acreditar em muitas coisas.

Abraço de PAZ.