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sexta-feira, fevereiro 18, 2011


Dono de mim, não menos de ti.


Às vezes gostaria que as coisas fossem mais simples. Porem creio que assim não é, por causa de nossas complexidades naturais. Trazemos implicitamente, emoções filhas de outras emoções, e o parco entendimento de quase tudo.

Nosso julgamento é baseado em nossos valores. O que não quer dizer estejamos certos. Fazemos como um espelho, na tentativa pobre de imitar o conjunto. O conjunto que é o ideal, é para nós a meta a ser atingida. Assim sendo, todos queremos a mesma felicidade que todos queremos. De preferencia igual. O ideal realizado de uma perfeição relativa. Se para isso seja preciso matar, esfolar, deformar ou simplesmente esquecer o que realmente somos. Fazemos do ideal alheio, nosso desejo. O ideal social é nossa vontade.

Vamos marchando para igualdade. Mas uma igualdade imbecil. Onde todos vestem o que todos vestem, falam o que todos falam, pensam como todos pensam, fazem questão de ser exatamente como o outro é.

Se fazemos isso de uma forma subjetiva nos aspectos vivenciais, que sobram as emoções? Fazemos do sonho algo literal. E sabemos que mesmo o sonho torna-se algo opaco quando mais ou menos converte-se em realidade. Bem a simplicidade já era. Ficou algo que é ao mesmo tempo um misto de agonia, ansiedade, desespero e vontades em ebulição. Tudo isso calando profundamente dentro de nós. Cantando com vozes mudas, ouvindo com ouvidos moucos. E a vida passando rapidamente.

Foi exatamente assim, que Joana veio com arma em punho me cobrar. Olhei para ela com a cara mais filha da puta que tenho. Tenho várias. Não admito cobranças. Aliás nunca cobro absolutamente nada de ninguém. Deixo o barco correr no mar vida, e tudo sempre está em paz. Porem aquelas emoções filhas de outras emoções, essas são foda. Nunca é a realidade em si, mas o que se passa por detrás delas. A coisa muda. Não preciso dizer, que ela estava furiosa. Este é meu dom natural. Para evitar mais transtornos, admito qualquer coisa, qualquer culpa, deixe pra mim. Eu assumo. Sou o responsável até pela bomba atômica se quiserem, fodam-se, e não me torre a paciência:

-Ei Joana, se acalme um pouco. Apenas tente aceitar o inevitável...
-Inevitável? Tu acha isso inevitável? Tu és um filho da puta cara...o pior...tu não presta...tu...

Queria fazer troça daqueles xingamentos. Mas procurei escutar, como um bom saco de pancada. Vocês sabem que o saco de pancada sempre vence. Deixei-a falando, respirando profundamente, enquanto pensava na cerveja no freezer. Em algum momento ela cansou e voltou ao aspecto civilizado da vida. Emoções tornam as pessoas brutais ou anjos, não há meio termo. Ela estava vivendo o inferno dela. Eu estava em casa. Quase sempre assim. Enquanto você masca a baba do demônio, outros estão por aí, sorrindo e sendo felizes. Bom que seja assim, é um bom equilíbrio:

-Então, tu me diz com essa cara de pau de que tens outras mulheres? Assim...
-Eu apenas respondi a tua pergunta. Só isso.
-Mas tu me trai, tu tá me traindo cara...por que ...eu não te basto...
-Joana, não misture as coisas. Esse é o maldito problema da humanidade. Mistura-se a porra toda, e acha que tudo é igual.
-Então me explica, tenta me convencer... vai...diz...
-Digo, tudo bem, mas antes, tu poderias fazer o favor de alcançar a cerveja na geladeira? Vamos beber juntos... e conversamos...

Muito a contra vontade, mas ela pegou. Quando voltou sentou-se na mesma posição, secando umas poucas lagrimas. Gosto de lagrimas, elas sempre são uma alma espremida. Algumas vezes umas das poucas coisas verdadeiras que carregamos:

-Traição é outra jogada. Traição é a mentira. É dizer que sou um santo, é te enganar propositadamente. Não estou enganando nada ou ninguém. Meu jogo é aberto. Se você quiser números exatos eu te dou. Traição é viver na ilusão. É dizer não quero, tendo vontades ocultas e fazendo-as escondido.
-Não sei, eu queria que tu fosses apenas meu... entende ? Meu.
-Entendo, quem não entende és tu. Sou teu. Tens de mim o que ninguém tem. Tens uma versão de Fabiano, que é apenas teu. Porque os sentimentos que me suscitas são exclusivos, únicos. O que faço contigo, não faço e não sinto com nenhuma outra. Vamos pensar na amizade, para melhorar a relação. Tens amigos que gostas mais e outros tu mais ou menos, tens uma relação de amizade com todos, eles tem seus gostos diferenciados, suas particularidades. E algumas vezes são mesmo incompatíveis em conjunto. Não somos iguais para ninguém. Agora se tu queres me aprisionar, imaginando com isso, isso me fará mais teu. Isso já é outro problema, minha cara, ai vamos adentrar ao egoísmo que carregamos. Tu me queres de uma maneira eu esteja afivelado. Tu achas que isso faz com que eu esteja realmente contigo? Bastará enfiarmos alianças, e com isso mato aquilo que é humano em mim?
-Mas me dói pensar que estas com outras pessoas, que deitas em outras camas...que...
-Esse é o erro sutil. Não sou eu. Aquele que deita em outra cama é uma versão que não te pertence. Certamente o que falo com outras pessoas não irias gostar, nem me reconhecerias ali. Mas agora, Joana, isso requer que se seja inteligente, mulheres com poucos neurônios, que constitui infelizmente a grande maioria, entenderão isso de uma forma desculposa, como algo que não corresponde ao suposto “normal”. Não pertencemos a ninguém, como um cachorro ou um gato. Não são assim as relações. E a natural beleza e frescor delas. Os fatos falam por si. Porque depois de anos de casamento, as pessoas se tornam estranhas? Porque amor não é isso.

Ela me olhava com uma expressão triste. Talvez quisesse entender e não conseguisse. Eu tomava mais um gole de cerveja, estava muito boa. Mas havia uma agonia magnética no ar. Muito sentimento direcionado, e outros tantos conflitos por não ser o ideal esperado. Uma relação madura é feita de compromisso com a verdade, e não de chaves, não de grilhões. Isso não é pra qualquer pessoa. Aos meus amigos eu sempre recomendo: que vivam suas vidas dentro da normalidade, daquilo que é ideal. Porque este tipo de vivencia não é pra qualquer um.

Depois de um longo silencio, Joana, me olha nos olhos, faz um misto de sorriso ou sarcasmo, algo assim no limbo da vida:

-Tu és um filho da puta, mas por motivo que desconheço eu gosto de ti.

Luís Fabiano.

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