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quinta-feira, novembro 04, 2010

Navalhadas Curtas: Um entardecer e dois Velhos.


Em meu breve intervalo, sentei-me uma praça próxima ao serviço. Sentia fome de respirar gente. Levei o Velho(Bukowski - Livro O Amor é um Cão dos Diabos) comigo. Queria sorver seus poemas duros. Ter o prazer de remover suavemente a armadura que os envolve. Então deleitar-me em minha solitude voluntária.
Um velho negro senta-se próximo a mim, neste instante. Tinha o cheiro de vida. Cheiro da miséria, da fome, sujeira, um forte aroma de mijo.
Olhei-o de canto de olho. Segui lendo. Notei assim mesmo, que seus olhos estava cravados em mim, com a boca semiaberta e um ar algo bestial.
Talvez ele quisesse algo?
Grana, uma cachaça? Fragmentos de minha humanidade? Ou a merda com tudo isso, baboseira repetitiva repleta de ausência e significado. Imitar bondade.
O olhar ainda cravado em mim. Então sorri dizendo:
-Vou ler algo pra ti.
Ele sorriu e acedeu com a cabeça. Então li um poema do Velho, curto, áspero e cheio de alma, começava assim: “ás vezes sou amargo, mas no geral o sabor tem sido doce. É apenas que tenho medo de dize-lo. Amor é doloroso e bom...”
Quando termino a leitura, aqueles olhos ainda me olhavam, uma boca sem dentes fazia o ensaio de um sorriso. E tudo que ele disse antes de ir embora foi:
-Esse cara é bom...esse cara é bom...
E foi embora com o vento, fiquei ali. Ganhei minha tarde, talvez meu dia. Ás vezes algo bom nos envolve, e toda miséria fica longe, bem longe.

Luís Fabiano.
A paz as vezes não tem dentes.








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