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segunda-feira, julho 19, 2010

Parede de sonhos.

Ontem voltei a sonhar. Detesto sonhar. Talvez seja a influencia do vinho ou rum em minha consciência, tornando-a um campo de batalha. Uma gostosa batalha admito, de gostos diferentes, intensidades diversas e percepções, hora vulgares, hora paradisíacas.
A noite foi feita pra descansar, sonhos me cansam muito. Nada contra quem sonha com algo. Mas eu prefiro ir matando meus sonhos aos poucos.
Prefiro não crer em nada, não imaginar possibilidades de algo, de supor ou crer em uma felicidade possível, se por acaso eu fizer tudo certinho. Decididamente não acredito em nada disso.
Respeito quem crê. Escolha o que lhe agrada, o que lhe excita, o seu ópio. Algo que torna a vida suportável, e viva como puder.
Normalmente não perturbo com sonhos. Deite-me depois de meio copo de rum. Quando dei por mim, estava em minha antiga rua, em uma casa que cresci.
Antes das reformas, antes do meu primeiro casamento, antes de tantas coisas.
Sabia o que iria encontrar ali. Mesmo em sonho, não existem grandes surpresas, a vida é meio assim pra mim. Fui entrando na casa velha, com paredes manchadas, e lá estava ele. Sentado em um velho banco, fumando seu cigarro, com meio copo de cachaça, com um olhar sereno. Talvez mais sereno que antes de morrer.
Sentei em um outro banco, meio de lado. Estranhamente, fazia tempo que não nos falávamos, mas nos comportamos sem arroubos de saudade. Uma civilidade quase não humana. Nos abraçamos ternamente, e como sempre ele chorou.
Sempre chorava quando me abraçava, não entendia o porque. Talvez por estar velho, talvez por amor, talvez por sentir que estava morrendo. Puta merda, morrer é algo, um mal terrivelmente necessário, que cria abismos de saudade, que transformam nossa memória em um museu de saudades.
-Então filho, como tu tá?
-Tô bem, vivendo, tentando viver bem. Tentando não ser tão mal as pessoas que se aproximam de mim. As vezes é difícil. Mudo muito de ideia e sofrer é inevitável.
-Faz boas escolhas filho, boas escolhas, pensando no bem que podes fazer. Não te preocupa com receber nada. Sei que és meio assim, mas alimenta mais isso.
-Ta certo.
Ele toma mais um trago. Aquele cara falando calmo, com um leve sorriso era meu pai, mas estava mudado. Acho que sempre muda, mesmo em sonhos é preciso mudar.
Ficamos ali sentados em silencio um bom tempo, mas algo preenchia. Era um silencio recoberto de emoção e pensamento.
Quando se está em sonho, não são preciso muitas palavras. É uma linguagem que fala ao coração tanto.
Senti que era hora de ir embora, nos abraçamos forte desta vez, o beijei. Fui retornando pelo mesmo caminho.
Acordei sóbrio, ou quase. Uma imensa tristeza invadiu minha alma, por um momento eu desejei que ele não estivesse morto, que eu não tivesse que o ter enterrado, que aquele sonho não fosse o um sonho.
Como é estranho o tempo, parece que o tempo que passamos vivos e juntos foi tão pouco, creio que sempre será pouco.
Cada segundo tem uma importância quase infinita, vamos percebendo isso no caminho, quando nos damos conta de nosso parco tempo.
Não consegui dormir mais, fiquei ali com os olhos aberto sondando o espaço escuro, como a querer pega-lo pelos olhos.Mas como...mas como .


Luis Fabiano.
A paz pode ser um pequeno pedaço de saudade.

Um comentário:

Anônimo disse...

Parabéns pelo texto acompanho o que escreves faz algum tempo e noto que tens melhorado a cada publicação... Com certeza teu pai deve estar orgulhoso por ver, mesmo estando em outra dimensão, a pessoa que vc se tornou, as coisas que tu consegues lidar em tua vida sem se deixar abater, sem deixar que te as mesquinharias do dia-a-dia tirem a tua paz.
Uma narrativa emocionante, um encontro formidável, que nos leva a refletir algumas coisas, nos incentiva a rever alguns conceitos e impulsiona a tomar decisões que por vezes covardemente vamos adiando, como tu bem colocastes no texto, “Cada segundo tem uma importância quase infinita, vamos percebendo isso no caminho, quando nos damos conta de nosso parco tempo...”, é isso o futuro é hj e não temos tempo a perder, mais uma vez parabéns!!!