Navalhadas Curtas: Piscar de Olhos
Hoje sai para minha caminhada vespertina, intervalo de tudo, momento em que minha mente deseja alçar outros vôos, um vôo sereno descansado. Um desejo quase uterino de fertilizar-me através da luz que vira sombra, nos transeuntes meus semelhantes, nas ruas de sempre, seu fluxo e refluxo, ora veias transbordantes, ora desertos de pedra.
Não sei exatamente o que procuro quando saio, apenas fico atento, olhos de vampiro, deixando que a vida me fale, fale o que quiser, eu escuto no meu silencio as vezes respeitoso, doutras, babujando ironia e sarcasmo, sou assim. Um pendulo entre o céu e o inferno, brinco com os anjos pela manha, rolo com os demônios a tarde, e a noite os ignoro a todos, até o amanhecer.
Mas hoje quis ver dentro da maior pureza possível, o fiel entendimento que se pudesse captar, essa relutando verdade, que insiste em escapar, em camuflar-se e fugir. Confesso que não gostei do que vi.
A medida que ia avançando em direção o Centro da cidade, a tarde ia ficando densa, o frio ficando mais intenso, e a tarde turvando-se de noite, olhei o semblante dos meus semelhantes e tudo que vi foi estarrecimento, o frio fazendo a deformidade de suas expressões. Por um instante pensei: Que porra é essa de frio? Não acho isso justo, tenha-se a explicação filosófica que seja, evolução da espécie, enriquecimento vibracional, realmente nada explica e nada consola, frio esta ali.
Pode ter sido casualidade, mas não vi ninguém sorrindo, todos andavam rápido, uma fuga quase desesperada, para a toca. Parei em uma esquina, olhei para o céu, e quase perguntei a Deus, quais eram suas intenções, mas achei melhor não, não é bom brigar com ninguém, vá que se precise, não é? Temos essa maneira de ser, cagões medrosos de Deus.
Não quis caminhar mais, ao passar pelas ruas escuras do centro, uma sujeira deixada pra trás de grevistas, reivindicantes, bradando palavras de ordem, e a sujeira ficando no chão, cartazes, garrafas de plástico, papeis, senti asco. Por um breve momento desejei que uma chuva caísse e carregasse a todos valeta abaixo, uma limpeza das ruas poluídas.
Desejei sentir humanidade, mas era impossível, quando um senhor trombou em mim, me empurrando e nem pediu desculpas...
Puta que pariu, o velho maldito foi a pá de cal, minhas intenções foram furtadas, pela escuridão, pelas ruas sujas, a greve, as pessoas se empurrando em ruas apertadas, intenções na sarjeta, escoando pelo esgoto.
Essa é a visão desnudada da realidade ?
É isso?
Que seja, se é assim então, degustemos juntos essa merda.
Luís Fabiano
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