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sexta-feira, abril 01, 2011


Navalhadas Curtas: A cretinice nossa de cada dia

Somos cretinos até a medula óssea. É da condição humana. Apesar de às vezes fazermos cara de coroinhas, olhar doce, maneiras gentis, para impressionar uma pessoa ou plateias inteiras, o vampiro que se esconde dentro de nós afia os caninos para sugar suas vítimas. Não há exceções, amigos. A cretinice é tamanha que, às vezes, somos compelidos a morder nossa própria jugular. E o fazemos claro, dependendo do tamanho da sede.

Toda filosofia babujada até hoje tem por objetivo elevar-nos às alturas, espécie de ascese, através da qual domaríamos a cretinice congênita. Por vezes atingimos altitudes não imaginadas, graças à fruição de nosso pensamento, embasado em teorias consagradas. Olhamos de soslaio o espelho e admirados nosso olhar santo, cheio de condescendência. Se houver tempo nos masturbaremos pensando em nosso ego.

Todavia, basta sentirmos cheiro de sangue - e fluídos seminais - para, num átimo, arriarmos pensamento e corpo das alturas, desabando no lodo, de onde, por nossa natureza cretina, não deveríamos ter saído. E quanto mais fétido o lodo, melhor.

A salvação, talvez, fosse admitir o quanto somos geneticamente cretinos, e não bonzinhos como gostamos de parecer. A verdadeira face revelada seria tão medonha que, muito provavelmente, resolvêssemos admitir ser possível mudança de atitude.

Por um tempo, provavelmente, os púlpitos se esvaziariam, bem como o número de frequentadores dos templos, envergonhados de mostrar em público a face terrível da cretinice. Não só os púlpitos ficariam às moscas, mas também as cátedras, as cadeiras palacianas, as mesas diretoras, os assentos parlamentares... Enfim, haveria um vazio perfeito, um vácuo perfumado, a ponto de, inclusive, acreditarmos na existência de Deus. Isto é, acreditando que Ele tenha resistido à praga da cretinice exercitada ao longo dos séculos.

Mas isso não acontece. É uma tolice imensa apostar nessa possibilidade. Ninguém ousaria deixar em casa seus caninos, os olhares cínicos, ferozes... Acaso fizessem isso, outros caninos mais ágeis esfomeados se avizinhariam para, rápida e maliciosamente, sugar todo sangue possível de ser sugado de nossas artérias, incluindo o corpo e a alma.

Não temos salvação. O mundo é cretino e ponto final. Ah, vou aproveitar meus cinco minutos de folga para ir ao banheiro. Gozar, claro. Por que eu seria diferente?

Manoel Magalhães
Jornalista, escritor e roteirista de cinema
http://manoelmagalhaes.blogspot.com/

6 comentários:

Anônimo disse...

Valeu, Magalhães, por essa pérola. Abraços. Gilnei.

Anônimo disse...

De critinece tu entende, meu. Teus livros são cheios de canalhas. Baita texto, parabéns.

Dea

Anônimo disse...

Que estreia, Manoel. O blog do Fabiano merecia teu talento. Abração.

Breno

Anônimo disse...

Penso também que somos todos cretinos, dependendo da situação. Não temos salvação. A morte, talvez.

Brenda

Anônimo disse...

Que texto cretino. Por isso é bom.

Anônimo disse...

Os livros que Magalhães escreveu não nos deixa mentir: é um dos melhores escritores que andam por ai. De suas páginas verte solidão, sangue, esperma, amizade, critinice e tudo mais que nossa sociedade fabrica. Fabiano, que me parece ser seu afilhado, o qual tenho acompanhado aqui, tem se revelado um seguidor honesto e competente Vai longe.

Janer