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sexta-feira, março 04, 2011

Apenas um pouco de loucura




Apenas um pouco de loucura.


Aquela foi a manhã final.
Depois de uma noite difícil, acordamos de mau humor prevendo a tempestade que iria cair sobre nós. Quase sempre tomo minhas decisões assim. Ao acordar já sei tudo que vai se desenrolar, mesmo os dramas que vão acontecer.
Ela me olha taciturnamente e diz:

-É bem como se diz, quando o amor acaba, acaba...

Sinceramente achei que seria fácil. Mas não. Eu disse que iria embora. Normalmente falo a verdade. Mas como não gostei do tom de como a coisa começou, eu liguei o "filhadaputometrometo". Passei a inventar qualquer coisa. Qualquer motivo serviria, pois afinal isso não iria fazer diferença.

A civilidade foi desaparecendo a medida que a conversa andava. Sou um cara de decisão com muita consciência. Essa a razão para não trazer arrependimentos em minha vida. Não faço esse perfil. É preciso saber o que você esta fazendo sempre, pense muitas vezes, raspe a ideia até ela estar no osso. E ai tome a decisão, uma decisão fatal.

Ligia tinha uma atitude descrente, e falava comigo tentando buscar o porquê da decisão. Diga-se de passagem, que tais conversas são feitas de uma inutilidade profunda, em se tratando de mim. Perdi a conta de quantas vezes, ouvi choramingas femininas. Como costumo dizer, depois da decima terceira mulher “oficial”e outras noventa informais, pouca coisa faz diferença. Mudam algumas coisas, mas a essência da conversa é a mesma. Por detrás de toda a ladainha, a voz que não se escuta diz: por favor, não me deixe, não quero ficar sozinha, me ame pelo amor de deus...

Eu colocava minhas coisas na bolsa, tinha poucas roupas lá. Mas à medida que isso acontecia, ela foi alterando a voz. E vi diante de meus olhos aquele amor todo, converter-se em ameaças, depois em tapas e depois em uma faca apontada para mim e outros escândalos Odeio este tipo.

Poesia do desespero. Odeio as passionais. Quando eu estava juntando uma cueca suja, ela começou a berrar. Aquilo eram gritos feitos de insanidade. Raiva de si mesma, orgulho ferido e mais alguma coisa.
Então veio pra cima de mim. Deu-me alguns tapas no rosto, meus óculos voaram longe. Agora eu estava cego, tentei segurar o braço de Lígia, mas estava muito enfurecida:

-Que é filho da puta....que é....vai agora me bater...seu puto de merda...é isso que tu és...tu não presta mesmo...vou te dizer...vai embora vai...filho da puta...isso mesmo junta as tuas merdinhas e vai... é isso que tu fazes... és sempre assim...eu te odeio...é isso eu te odeio...

Eu fazia meus movimentos lentamente, juntando algumas meias e óculos. Ela xingava e desaparecia, voltava com um cigarro na mão. Naquele estado eu não iria dizer mais nada. Por vezes é assim mesmo. Eu não precisava colocar empurra-la mais para o inferno e dizer tudo que eu não gostava, não gostei ao longo daquele tempo. Já estava vivendo o pior deles.

Então ela veio novamente. Com o cigarro em punho, queimo minhas costas. Aquilo doeu. Mas ainda não era motivo suficiente para bater nela. Tais ideias às vezes me passava na cabeça. Mas eu não queria incômodos com a lei. Queimaduras de cigarro passam, tapas curam e arranhões também. Ainda juntava minhas coisas e tentava sair. Foi quando ouvi a porta bater, e duas voltas na chave. Ela havia me encerrado dentro de casa, com ela dentro.
Aquele não era um bom dia. Gritava o tempo todo coisa insanas:

-Agora tu vais ter que conversar comigo... otário...filho da puta...vais ter...hahahaha...vais ter...não tem pra onde sair, hahahaha. Te peguei otário...

Esse é um daqueles momentos perigosos em uma relação amorosa. Momento onde o inimigo tenta te encurralar de todas as formas. Para quem leu a Arte da Guerra, sabe que isso é algo que nunca se faz. Diz o mestre Sun Tzu: “nunca deixe teu inimigo sem uma saída, porque não tendo nada a perder, ele partirá para cima de ti.”

Aquilo significava que eu iria apanhar ou iria bater, matar ou morrer. Terminei de juntar minhas merdas, fui em direção à sala, quando chego, um quadro voa para cima de mim, era um pequeno quadro, desviei e aquilo bateu em umas garrafas de bebida, que caíram no chão e quebram. Eram muitos os significados. Não sentia medo dela, tinha medo de mim.

Então me sentei no sofá, como se nada tivesse acontecido. Olhei para ela com tranquilidade, ela tinha nas mãos um copo pronto para jogar:

-Lígia, se acalme. Calma... que isso que você esta fazendo? Diga-me que isso que você esta fazendo?
-Tu não vais embora vivo daqui Fabiano...tu achas que é assim? Decide e vai embora...tu achas que sou o que ? Que sou tua palhaça?

A expressão dela estava horrível. Teria que ser mais filho da puta ainda, eu precisava sair dali. Houve um silencio de uns três minutos. Silencio sufocante, ela respirava como se o ar fosse faltar. Permaneci na minha, esperando a coisa acalmar um pouco. Eu cuidava o copo. Então inventei um ssubterfúgio

-Lígia, queres aguá Eu vou tomar...
-Sim...

Trouxe a aguá ela bebeu. Sentei-me novamente. Não fazia movimento algum, apenas a olhava. Quando existe tanta violência envolvida em um amor, é preciso saber esperar. Não que ela vá entender, mas irá cair no extremo oposto de tudo, que é a dor mais franca. Aí vem às lagrimas do luto, a noção que nada adianta, o estado de dor que pode levar a pessoa a processos mais complicados. Mas o normal é dentro de alguns meses, tudo estar bem.

Por fim ela solta o copo:
-Lígia, não faça assim, não torne o que já é algo desagradável e doloroso em coisa pior. Vivemos uma vida onde as pessoas não pertencem às outras pessoas. Nunca tive uma dona. Não sou propriedade privada de ninguém. Muito embora o sentimento amoroso esteja misturado erroneamente a tudo isso.
-Porque tu vais embora?
-Acabou a emoção.
-Mas nós não brigamos, nós não discutimos, nada...
-Tu achas que somente isso basta?
-Como uma emoção acaba assim?
-Não sei, as minhas acabam assim. Eu nunca fui cativo de nenhum sentimento. Gosto de sentir e isso nada tem haver com eternidade.

Ficamos mais civilizados. Tais finais nunca são simples, conversamos até a noite cair, uma conversa que não muda nada, mas faz perder tempo. Eu não iria voltar atrás, deixei isso claro para ela. Mas como toda mulher, elas ficam alentando. Consegui que abrisse a porta. Creio que como ela, a casa estava destruída por dentro. Naquela loucura, ela quebrou porta retratos, quadros, utensílios, bateu as portas da casa, derrubou cinzeiros pela casa, e esteve como uma faca na mão. Olhei nos seus olhos e não achei disposição dela pra me matar. A faca tremia como se tivesse Parkinson. Por fim largou-a no chão.

Mais uma vez isso. Creio que cansei de tais loucuras. Hoje tenho me mantido a distancia de todas elas, nada de passionalidade e amor repleto de egoismo. Tenho aspirado coisas mais suaves para minha vida. Quero estar em paz comigo mesmo, me deixar conduzir por mares mais tranquilos, rios mais serenos, e córregos sossegados.

Carrego em mim muito desta insanidade, e isso que faz se aproximem de mim. Pois não há diferenças. Tenho andado a procura de mudanças. Não sei aonde isso vai me levar, mas como sei que a vida tem de ser uma surpresa, então tudo bem.

O telefone toca, olho para o celular, ops... é Lígia.


Luís Fabiano.

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