Covil de Lobos.
Tenho um forte viés que atrai insanidade. Acabo atraindo sempre o caos. No entanto dentro de mim, tenho a impressão que tudo esta em perfeita ordem. Ao menos a primeira vista. Embora saiba do caos, ele não me transtorna. Não preocupo muito. Meu quarto é um caos, roupas espalhadas, poeira por todos os lados, muitas baratas, livros por todos os cantos, absolutamente nada esta ordenado. Pra mim está perfeito.
Eventualmente alguém diz que o meu quarto é o espelho da minha vida. Sim, e ai ? Qual o problema? Gosto que minhas sombras fiquem evidentes, para que ninguém diga que se enganou.
Talvez as pessoas tenham razão. Minhas baixezas são evidentes, meus peidos são sonoros e meu descaso pela maioria das pessoas que conheço também, não escondo nada.
Quando canso de tanto caos, saio pra rua. Tenho estado rua demais ultimamente. Encontrar as melhores pessoas que eu posso conhecer. Meus mestres. Desconhecidos bêbados, ladrões arrependidos, drogados viciados e morrendo, prostitutas e travestis tentando levantar algum, e outros tantos sem nome ou rosto, que vagam a noite a dentro.
Me sinto bem entre eles. Com o tempo eles se tornaram meus iguais. O vomito da sociedade me satisfaz. Quase sempre bebo sozinho, porem não consigo permanecer sozinho muito tempo.
Alguém sempre aparece. E acabei encontrando o Jorge de novamente. Estava com aquela cara de cachorro cagão. Sentou-se ao meu lado:
-Bah meu...sabe...foi mal aquele dia ...sabe...me enlouqueci...a historia do chefe sabe. Se tivesse uma arma, tinha matado o filho da puta...
-Seguinte Jorjão, não começa com esta merda novamente, na verdade to cagando pra ti e o teu chefe, ou a natureza morrendo pelo desmatamento, ou a áfrica com fome...
-Não, não, já passou...cara...sabe...aquele dia tinha me chapado demais, bebido e tomando uns comprimidos ai sabe...acho que misturou tudo, tava com disposição de...
Depois disso ficou em silencio, bebendo uma cachaça. Um boteco nas proximidades da Avenida. Era antro extremamente mal frequentado. O lugar começa a ficar interessante depois da uma da manha. Então seres estranhos, que só saem a noite aparecem. Autênticos vampiros. Todas as tribos. Não tenho problema com tribos, contando que não encham o saco.
Fui no banheiro da uma mijada pra colocar a cerveja pra fora. O local tem um banheiro muito interessante. Ele é comunitário, ecumênico, ambos os sexos, tem dois vasos com portas quebradas. No corredor do banheiro, duas mulheres se abraçam, beijam, se esfregam. Porra isso mexe com cabeça de qualquer homem. Era uma bela cena, parei olhando aquilo. Estavam de saias curtas e pernas entrelaçadas. Aí se deram conta que eu estava olhando. Sorriram as putinhas, e uma delas cuspiu:
-Se manda, que esta mulé é minha...vai saindo otário...
-Cala aí...olha garotas eu até sairia, na real to afim de mijar, e a bunda de vocês esta no caminho...então se me derem licença...
A mais masculina, tinha uma expressão de mais macho que muitos homens que conheço. Bizarrice. Arredou, eu passei. Quando chego no banheiro, que mais lembrava o Vietnã pós guerra. Olho para o vaso, e ali estava uma verdadeira sucuri feita de merda. Porra, aquilo não iria embora com nenhuma descarga deste mundo. Teria que ser morta a pauladas. Muito grande e grossa, parecia viva. A merda viva. Fiquei pensando na dimensão do cú que saiu aquilo?
Ri de meus pensamentos, afinal quem não vê cara, certamente não veria aquele rabo. O ser humano é capaz de arte com tudo.
Voltei ao balcão. Jorjão estava mudo. Bebia sua cachaça em um silencio como se tivesse rezando. Talvez tivesse, afinal uma prece não precisa ser feita de ritual. Aqueles os olhos vidrados, talvez estivessem convesando com os anjos, ou com o outro. Deixei ele quieto. Foi quando chegou um sujeito meio nervoso ao balcão. Pediu uma cerveja, e olhou pra mim. Então discretamente, falou seu menu de drogas:
-E ai camarada...tenho aqui o que você quiser, pó, extase, mdma, maconha de Baracoa e umas anfetaminas...aí ta interessado?
-Não cara, obrigado. Minha vida já é uma droga, pra que acrescentar? Não sou bom de drogas.
O cara estava alto. Percebi por sua pupila que mais parecia uma bola de tênis. Tomou aquela cerveja em três minutos e foi embora. Parecia estar disparando de algo. Aquela madrugada de quinta parecia quente demais. Fiquei pensando, e agora que virá?
A resposta veio mais rápido que um jato de porra. Uma velha cheia de tatuagens, com pierces e cabelo raspado, começa a berrar e abre a camisa, mostrando um par de tetas murchas e bicos escuros:
-Tu não queres mais chupar a tua amada – dizia pra outra mulher- achas que to muito feia?É isso... E cadê amor porra? Onde tá?
Essa é a pergunta que não quer calar. Ela fazia o escândalo e maioria ria. Por fim acaba chorando abraça na ex-companheira. Acho bonito quando tudo termina em amor. Porque tudo que queremos é paz. Estar tranquilo consigo mesmo, e se possível dividir algum sentimento com alguém. Gosto cada vez mais desse lugar, onde miseráveis filhos da puta se congratulam.
Eram três da manha, e hora de retornar pra toca. Fui me arrastando devagar, respirando o ar da noite, e como um lobo que volta ao seu covil, tudo que queria era minha cama e dormir.
Luís Fabiano.
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