Dança das Lágrimas.
Ela fazia uma espécie de pole dance estranho, em um palquinho improvisado. Tudo começava bem, havia felicidade e erotismo em sua sinuosa dança. Movia-se como uma serpente, até que era mais ou menos bom. Então, do nada ela começa a chorar silenciosamente, enquanto a musica técno embala suas lágrimas. Sensacional.
Em meu tolo pensar, achava que aquilo fazia parte do show. Puteiros baratos fazem coisas que até Deus duvida, para manter os clientes ali, gastando, bebendo e olhando o desfile de xoxotas.
Eu gostava de ir lá. Não era caro, não estava interessado em comer ninguém mesmo. Mas é bom olhar mulheres se despindo, mexendo a bunda, suando ao som da musica, e depois tudo acaba de-repente, as luzes se apagam, a morte se faz. Ali não haviam aplausos ou assovios, nada. Então vinha a próxima, o próximo trem.
Aqui em minha cidade não existem “super” Puteiros. Conheço todos. Apenas comuns, simples mas com carne boa. Para mim que estava exercitando meu voyeurismo, estava perfeito. Não sou exigente com nada. Queria relaxar apenas. Uns bebem, outros fumam maconha eu fico ali sentado observando-as. Como um pescador a espera da xoxota sagrada.
O show cheio lágrimas de Ivana era a melhor parte.Talvez o ponto mais alto do meu nada existencial. E de tanto ir lá, e ela me achar com cara de otário, um dia veio falar comigo:
-Mesmo banco, mesma cerveja, mesmo copo, mesmo olhar, sempre o mesmo do mesmo...
-Então a vida não é fantástica? É preciso comer, beber e foder as vezes...sempre o mesmo...acho que a vida gosta de replays...
-Então você fala?
-Raramente, houve um tempo que tive o que dizer, agora baby, meu negocio é ação...
-Me faz uma boa ação, paga uma cerveja?
-Claro. Aí meu camarada uma gelada para a dama aqui... – digo ao garçom
-Gostou do Show?
-Sim, tuas lagrimas dão um toque especial.
-As únicas coisas verdadeiras são as lágrimas.
-Porra, que bom. Por um momento achei que era efeito especial...
Ficamos em silencio um pouco, um sorvendo o outro e a cerveja ambos. Como tudo que segue a minha pessoa, nada é planejado. Não tinha expectativa nenhuma com ela ou ninguém. Sentia-me satisfeito com quase nada. Em tais ocasiões a vida pode parecer muito boa. Além do mais, putas sempre querem dinheiro. Seu corpo nú em cima de mim poderia ser bom. Mas eu queria as lagrimas. Pontas de uma verdade. Ainda que fossem feita de merda, isso eu queria.
Meu grau de patologia esta aumentando dia após dias. Aproximando-me mais dos lunáticos, os que entendem a vida sem cristais coloridos, os que engolem em preto e branco.
-Gostei de ti...Sr?
-Pode me chamar de Tigre. Os poucos que me conhecem intimamente, me chamam assim...intimidade comigo não é fácil, prazer...
-Ual Sr Tigre...isso parece promissor.
-Nem tanto, tudo fica por conta do pensamento das pessoas... coisa que você faz bem, quando incendeia o palco com seu corpo, e depois apaga o fogo com suas lágrimas...
-Que lindo isso, nunca ninguém me disse algo assim...
-Baby, eles veem o pior em ti...e eu sou sempre o mesmo.
Se tem uma coisa canalha a ser feita, é puxar a linha quando você sente que o peixe fisgou. Ivana não era uma mulher forte, havia toneladas de carências, e como qualquer felino eu sinto o cheiro disso.
-Ivana, to indo embora, esta noite o show acabou.
-Tu me dá uma carona?
-Ok.
A madrugada avança enquanto a levo para o Navegantes dois, um subúrbio nos arrabaldes da cidade. Ruas labirínticas, dobrei tantas vezes e finalmente sua casa. Um lugar simples, mas mais limpo que eu.
Ela convida-me a entrar. Como sempre penso, dificilmente alguma coisa boa pode acontecer depois da meia noite. Eu estava em uma vila, as três da manha, como uma dançarina de puteiro, agora faltava o gran finale, um assalto ou uma violência qualquer...
Ivana coloca uma musica, sobe em sua cama, pede para que eu sente em uma pequena cadeira quebrada. Então dança. Uma dança horrível, fazia aqueles movimentos desarmônicos, eu não sabia onde isso iria dar.
Horrível ou não, era um show particular. Por fim ela começa a chorar novamente, a musica vai acabando e seu rosto lavado de lágrimas. Dentro de mim, um misto de excitação e piedade. O ser humano é tudo isso.
A musica vai silenciando, me ergo, quero abra-la um pouco. Esqueço do pior em mim. Não sei o porque daquelas lágrimas e outros tantos porquês. Não fazia diferença, encosto-a em meu peito a espera que ela escute as batidas de meu coração. Me faço bom em meu reino de misérias. Fico ali, ela me abraça forte, já não há mais dança.
Luís Fabiano.
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