Consequências
Parte I
Um lenço branco esquecido descansa sobre a mesa molhado,
tudo era lembrança, porque devia ser assim? Chorar é imprescindível ao
viver...mas não somente isso.
Dilam começa o namoro com Miranda.
Eram adolescentes com os hormônios a flor da pele, tudo são
desejos, tesão e genitais umedecidos, é a linda sinfonia da natureza dizendo...
foda, foda, foda ou para ser mais poético, reproduza, reproduza, eu a natureza
quero me perpetuar através de ti. Muitos acreditam nisso... e isso é
consequência.
Naquela noite Dilam queria Miranda, mas local, sem
dinheiro tiveram a ideia de ir para o Parque da Baronesa, ali naquela escuridão
daquele verão belo, Dilam come Miranda com amor... ela perdeu o cabaço entre as
arvores, no mato e grama úmida, com o céu repleto de estrelas cintilantes, numa
apoteose romântica que só acontece na inocência, eles tinham dezessete e quinze
anos.
Noite linda, paixão besuntando tudo de vida e claro a
pobreza... mas a poesia acaba ali... naquela noite, Miranda estava ovulando e
daquela trepada única ela engravida... consequência.
Ambos eram de famílias muito pobres para não dizer
miseráveis mesmo, não estudavam, então agora teriam que trabalhar, porque a
possibilidade de aborto sequer não passou mente deles... os pais eram
religiosos ortodoxos, tudo se convertia em pecado diante de Deus. Um Deus que
cria regras para fuder a consciência dos seres humanos...cara legal esse.
Sem dinheiro, agora trabalhando em um serviço miserável,
para conseguir uns míseros trocados, assim neste clima cresce a barriga de
Miranda. Os dois jovens sentem o peso da responsabilidade, mas que merda,
embora em uma era de tanta informação, eles estavam cegos de desejo, porque uma
informação não significa nada diante dos desejos, explique a um viciado que o vício
é algo ruim? Ele até pode saber, mas jamais ira entender porque uma ideia é
fria diante das emoções quentes que vivemos... ideias ficam, ideias se perdem,
mas desejo...puta que pariu...desejo é um trator passando no teu peito te
empurrando para teu objeto de desejo, é uma corrente estendida rompendo a
moral, rompendo a ética rompendo as direções.
Naturalmente a vida de Dilam e Miranda se transformou uma
merda, antes mesmo de começar...religião mal dirigida, preconceitos, pobreza,
pouco entendimento, serviço de merda e um filho indesejado a caminho.
Começaram a brigar...porque o que sentiam romanticamente
não era e jamais seria amor...era desejo puro simples, mas é de nossa natureza
romancear o brutal, romanceamos tudo para tornar palatável a existência, para
que ela não seja tão crua, adoçamos muito a merda do viver...para tornar
melhor, porque viver a realidade pura e simples pode ser bem desagradável, se
pensar bem...que motivos você teria para ser feliz? Pense rápido, e dirás, meus
filhos, meu trabalho, minha família um amor talvez? Pois é..então você é feliz
assim? Pouco importa o mundo, as merdas existências, a violência, a fome a
doença... mas a verdade é essa, você é feliz porque é profundamente egoísta... mas
relaxe não há mal nisso, isso também é da nossa natureza territorialista, ta
tudo bem e justificado.
Sejamos felizes e foda-se o mundo, é saudável. Consequência.
Dilam e Miranda brigam, Dilam está pressionado, teve de
parar de estudar, trabalha como escravo e seu padrão o trata como um bosta,
porque ele não sabe coisa alguma, por outro lado Miranda, cresce e por um
motivo natural, ela não gosta do que carrega na barriga, suas amigas agora não
tão amigas debocham dela, ela perdeu as curvinhas de menina, esta inchada,
sente coisas que jamais pensou em sentir... por muitas vezes pensa que gostaria
de tudo acabasse rápido, que talvez a criança morresse ou que ela mesmo
morresse, se sentia inferior, os pais preconceituosos não olhavam mais a filha
como menina, era uma mulher...e portanto não havia mais incentivo de coisa
alguma. Mãe, menina, mulher, perdida, aflita e querendo morrer... pura
consequência.
Porque fim chega a hora do nascimento, em um hospital
comum, sem pé natal, sem berço, e algumas poucas roupinhas e um milhão dúvidas
sobre o futuro. Chegam ao hospital e a apesar dos péssimos atendimentos a
criança sobrevivente consegue nascer, mas a família não aparece, o Dilam pai,
desesperado, querendo beber com os amigos, querendo celebrar a liberdade,
querendo viver e desafogar-se da merda que se encontrava, era um pai de 17 anos
que não estava feliz com o nascimento de Maria. Sim mais uma Maria sem mundo,
sem futuro, que iria tentar sobreviver ela era a consequência.
Mas que merda tudo tem consequência... e tudo tem mesmo.
Nada é vão. Um simples peido tem consequências, uma decisão mal tomada e você é
cativo das consequências...mande a merda, mande se fuder...mas isso pense pra
caralho...sempre.
Eles vão pra casa de ônibus, mãe criança, a criança e o pai
que se olham e não sentem felicidade, não sentem prazer algum, o amor de Dilam
se foi, a criança pra ele representa um cativeiro que teria que se libertar, os
olhos brilhantes de Maria é uma sonata feita de esperança, mas Maria não sabe
nada, porque é assim, sempre sabemos como começa, mas nunca sabemos como irá
terminar.
Chegam a casa dos pais de Miranda, a família está na
culto, Miranda não consegue dar o peito para Maria, suas tetas estão secas, ela
repudia a criança, ela repudia Dilam, e Dilam não é mais o mesmo. Afinal pensa
mas que deu errado? Porque tudo tinha que ser assim? Então Deus havia virado de
costas para ele? Talvez. Quando a natureza entra em jogo, Deus parece sair de
cena.
Nem infância ou adolescência, Maria chorava muito, tinha
fome, aquilo incomodava a todos, os pais de Miranda, Dilam e todos. Então
arrumaram um litro de leite para dar para Maria. Miranda não sabe cuidar de
criança, ela preferia quando eram as boneca, mas bonecas não cagam, não comem e
são silenciosas.
Eu sinceramente achava que Maria não fosse sobreviver... mas
para entender isso seria preciso um milagre. Ninguém ajudava, davam leite pra
criança quando tinham...ela chorava muito. Dilam passou a estar mais ausente,
começo a beber e a ficar nos bares. Que fazer, ele queria também fugir, se
aliviar, aquela maldita criança chorando não aguentava mais. Curiosamente,
grana para as bebida existia. para o leite faltava. Miranda tentava seguir sua
vida, queria ser a menina novamente, queria voltar a escola, queria ver as
amigas, queria a vida que perdeu. Coisas que Freud explica.
Saudade, subemprego, cativeiro, choro, fome, tristeza e
vícios...consequência.
Dilam passou a beber como gente grande, e naturalmente se
viciou, chegava bêbado em casa, discutia com os pais de Miranda, e mesmo no
pequeno cubículo que a família fez para eles, Dilam mostrava que estava
mudando. Agora Dilam falava mais grosso, chegava bêbado todos os dias e começou
a dar empurrões em Miranda...
Luis Fabiano
Segue.