Rei das Bucetas, látex, um cão furioso e Rebeca Sharon
Parte 1
Existem dias e dias. Dias bons, dias ruins, dias que tudo
dá certo e dias que a divindade vira as costas para você. Deus as vezes pode
ser temperamental, não digam que é em função do mistério? A puta que pariu com
o mistério, Deus é um mistério, o diabo é um mistério, os Ets são um mistério.
Todos fingimos saber exatamente o que é, mas sorria, ninguém sabe realmente
nada. O crente ajoelha-se e pede a Deus...e tão pouco sabe o que está
pedindo... então ele fica “bonzinho” para agradar o seu Deus...é isso, estamos
sempre tentando agradar a Deus, para que ele atenda nossos “importantíssimos “desejos.
Tudo bem, o sistema parece funcionar.
A real que se você inventar um sistema para negociar com
Deus... vai funcionar porque o móvel de tudo isso é você mesmo. Deixe pra lá,
sabemos como é. Pessoas inteligentes mudam de opinião sempre, somente limitados
ficam com o mesmo pensamento a vida toda, os adaptados mudam então...
Estava em casa, estava com uma maldita coceira de sair
pra rua, mas olhando a cidade pela janela a noite, gostava do que via. Gosto de
olhar a noite da janela do quinto andar. Luzes e trevas, milhares de caminhos,
milhares de possibilidades a vontade visceral de se perder na trilha, o carro
em alta velocidade que não vence a curva, o enfrentamento do destino errante,
desfilando uma briga continua da insanidade e a sanidade, seja lá o que for
isso.
Sirvo mais uma dose de rum, tomo como uma homeopatia,
lentamente deixando o torpor incendiar o que há em mim. É sempre uma surpresa,
as vezes adormeço e doutras vezes me torno pior ou então fico tranquilo sereno.
Mas ninguém bebe para ficar caridoso.
Então como um raio inesperado vem a minha mente, a
lembrança do bar do Rei das Bucetas. O Rei é meu segundo pai. Mantem um estilo
distinto, fazia muito tempo que não aparecia por lá. Ir lá sempre é um tsunami,
tem a Jussara que é minha puta eterna. Tudo tem um preço.
Dou mais um talagaço no rum...deixo o copo sobre a mesa,
espalho meus restos por ai... Visto uma bermuda e uma regata, chinelos eis meu
uniforme para as merdas existenciais, me sinto leve.
Pego o fudet no estacionamento, agora a hora grande está
fechando, meia noite, a hora que as princesas se transformam em bruxas, afinal
quem gosta de princesas? Queremos mais que as bruxas vençam e venham com seus
encantos miraculosos, e nos enfeiticem com certa violência. que arranquem
nossas virtudes sem poesia.
Ligo o rádio, Elis Regina tocando o bêbado e o
equilibrista, puta merda Elis é sensacional, ouvir Elis é uma experiência espiritual.
fico sorvendo um pouco antes ligar o carro...” a esperança dança... na corta
bamba de sombrinha e cada passo desta linha pode se machucar...” Essa linha bem
poderia ser o fio da navalha não é? Desfilando na linha do fio de uma navalha,
é foda...você pode se machucar também.
Dou a partida e me dirijo para o bairro Navegantes. Noite
linda de uma semana complexa. Chego no bar do Rei. O pagodão ta rolando, o
Tonho do Cavaco me olha e balança a cabeça, um Raça Negra tocando, Betão
atendendo no balcão esta tranquilo o ambiente ta movimentado, pessoas indo e
vindo, o pessoal tomando sua cachacinha da noite. A mulheres da localidade ali,
se embalando ao pagode, o bom e natural cheiro de esgoto que vem das ruas de poeira,
rua de gente simples. Não existe luxo ali, pobreza, pagode, cachaça e sexo para
aturar a vida. Desço do Fudet, vou em direção ao balcão, vou beber a minha também:
-E ai Betão?
-Fala Fabiano... fiquei sabendo de uma festinha lá do Pestano
hein... pegando pesado cara?
-Que isso Betão, o Tonho ta falando demais...o Nego
Nelson apaziguo as coisas...
-Não foi o Tonho não, foi a Jussara que vomitou tudo
aqui...
-Vixe...mulheres né? Que posso dizer... é verdade, sempre
o que falam de mim é verdade... serve uma ai Betão...
O boteco, cheio, mesas de plástico, cadeiras de plástico,
tudo cheio...as pessoas gostam de estar lá, o estrangeiro sou eu. Betão coloca
a cachaça sobre o balcão:
-Betão, cadê o Rei?
-Sua majestade anda por ai... tava ai ainda pouco, e uma “loirona”
chamou ele em um Mercedes, e ele saiu com ela...sabes como é, ele ouve o
chamado do amor e vai... Majestade parece que tem trinta anos né?
Puta merda
que disposição para o mal e para o bem...
-É vero. Vou ficar por aqui então...
-Fica... a Jussara tava por aqui ainda pouco também...
adora ficar na roda de samba...
-Sei... deixa quieta...Jussara demais por uma semana, faz
mal a saúde...
Tava de boa, tem vezes que a vida é assim, ficar olhando
o nada. Seria bom falar com o Rei. Então surge Zuleica. Uma moradora da
localidade, gorda, muito gorda, cabelos tingidos com agua oxigenada loira, raízes
negras, com algumas espinhas na cara, sempre vestida de maneira vulgar, o que a
tornava adorável, um vestido vermelho coladinho, que a cada três passos que ela
dava, tinha que baixar porque se não mostrava a bunda imensa, tetas de
gelatina, pernas que balançam em um salto alto. Zuleica é assim, e gosta de ser
assim. Eu a conheci a muito tempo, em uma briga dela com a Jussara... não
separei as duas, não me meto. Deixo que se peguem a pau, gosto de lutas
femininas, são vulgares e ridículas.
-E ai Fabiano... visitando os pobres?
Esqueci de mencionar, Zuleica é má, irônica e debochada. Ela
mereceu as porradas que Jussara deu nela.
-Que isso Zu...eu sou pobre tanto quanto...
-Sei... e ai Fabiano... tais esperando aquela nega
imprestável?
-Zu, fica fria ai ok? Sem confusões por hoje...mas não,
to esperando o Rei...
-O Rei me comeu ontem sabe.... Esse é homem de verdade...macho
a moda antiga...come até arregaçar o cu e a buceta.
-To ligado Zu... mas fora isso que como ta a vida?
-Uma merda, me fudendo muito, trabalhando feito uma
escrava em casas de familia... e nada de papai Noel... bem feito né? Quem
mandou não estudar...
-Papai Noel? Que merda essa Zu... além do mais todo mundo
tem que trabalhar...
Não sei foi a cachaça ou sou eu mesmo. Gosto de mulher...
gosto de todas elas...talvez se fosse possível, gostaria de fode-las todas, em
uma gozada planetária coletiva. Sempre pensei nisso quando era mais jovem. Mas
creio que isso não é possível ou é? Seria lindo. Mas por enquanto eu estava
olhando as tetas caídas de Zuleica, aquele vestido sem sutiã, os bicos duros,
grandes e grossos marcando o vestido, ainda que o bico esteja meio virado para
baixo. Estas coisas são tentações eternas. Ela percebe, as putas sempre
percebem. Sorri safada...
-Te agradou Fabiano? Quer chupar minha tetinha? Chupa
gostoso...vamos lá no barraco agora...
Cachaça me amolece o centro que diz, isso esta errado.
Tive vontade de ir lá...mas não ainda. Toco no pau, ele esta meio duro. Zuleica
facinha... que poderia ser melhor?
Então um Mercedes dos grandes estaciona na frente do
boteco. Majestade desse... uma autentica apoteose. O Rei é dono do local. Um clássico,
ele esta vestido de branco de cima abaixo, chapéu branco, um dente de ouro,
sapatos brancos e uma bengala branca. Puta merda tanta poeira naquele lugar e o
Rei sempre impecável.
O pagode para. É sempre assim, todos respeitam o Rei, o
velho que come as mulheres, e elas querem mais, querem sempre, se apaixonam,
querem seu amor. O Rei das Bucetas. O Rei manda o pagode seguir e a festa
segue. Então ele vem até mim.
-Filho...filho... quanto tempo hein? Tu és assim né?
Esquece de encontrar as pessoas, esquece de ver quem gosta de ti...porque
Fabiano?
-Qual é Rei? Eu também estou com saudade...
-Sei que és filho de Xangô... tu administra a tua justiça
filho...mas cuida das pessoas, não usa de tua frieza a quem não merece.
Dei um forte abraço nele. Ele se encosta no banco, a
cachaça dele chega e brindamos. Zuleica se afasta, mas fica ali ao lado como
uma cadela de estimação aguardando o comando. Eu ainda pensava nos bicos caídos
dela.
-E ai Rei... qual é a boa?
-Filho eu vivo e estou vivo, bebendo de minha cachaça e
amando minhas mulheres. Não preciso nada mais de Deus.
-Tem coisas que jamais mudam é ou não é Rei?
-Tudo sempre muda filho...tudo, não somos o mesmos de
ontem, não seremos os mesmos amanhã...é que demoramos para perceber isso.
-Como amar todas as mulheres Rei?
-Isso não é para qualquer pessoa...amar com liberdade
exige muita responsabilidade, exige verdade total, exige um amor maduro ao
extremo... se você tiver estes ingredientes na alma...bem ainda tem que haver química...
Segue .
Luís Fabiano
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