Estela, Toni Feroz, merda e alguns traumas...
Parte 1.
Existem coisas que estão para além da ética e do bom
senso. O ser humano faz um esforço tremendo para conter-se... represando seus
instintos, e mesmo alguns, entre quatro paredes se seguram... medo, insegurança,
contrapartida de uma moral idealizada, que longe esta da realidade. A realidade
é um grito de vomito em uma catedral.
Fui descobrindo as coisas devagar. Tem vezes que é melhor
assim, dá tempo para que as percepções se atualizem tranquilamente, e a alma
vai se acostumando a dor ou a indignação. Por vezes você deseja que a realidade
seja uma fantasia, que a realidade seja o que ela não é, mas como uma jaula de
insanidades, grilhões de sanidade, você esta ali... e não há escapada. Simplesmente
não há.
Encontrei Maria Estela dias atrás, em minha andanças pela
noite. Noite intensa, noite feita de fantasma, Pelotas arrastada ao abismo, a
alguns passos do diabo. Bebidas, bar cheio no porto, drogas e a razão se
perdendo, ótima ideia. Eu andava sozinho, como quase sempre. Gosto de minha
solidão. Ao contrário da maioria das pessoas, preciso de solidão, preciso mais
tempo comigo mesmo que com as outras pessoas. Minhas ideias se decantam assim a
agua fica translucida. Emoções nítidas, pensamentos mais calmos.
Cheguei ao bar, era tarde pra caralho, na hora dos
vampiros, lobisomens. Gente demais naquele bar, mas foda-se. Fiquei por ali e
consegui ser atendido. Peguei minha bebida e fiquei esperando algo acontecer.
Sou assim, como um maldito pescador, nada de planos, me entrego ao que
acontece... deixo a merda toda vir a tona. Então ela apareceu no meio da
multidão. Estava com o aspecto horrível, havia bebido, maquiagem borrada. Era a
Monalisa das desventuras. Sou suspeito de falar, gosto de mulher com a maquiagem
borrada, lápis de olho se diluindo, baton arrastado para fora dos lábios. Maria
Estela, estava concentrada em si mesma, não me viu e parou ao meu lado. Sozinha
com um copo grande de caipirinha na mão. Deixei assim mesmo, e então virei para
o lado:
-Maria Estela... tudo bem?
Ela fica me olhando, talvez somando ideias, então se da
conta:
-Fabiano? Porra cara... quanto tempo...
Me aproximo mais, a abraço e sinto um forte cheiro nela.
Um cheiro que mescla perfume, um pouco de mijo e suor. Esta é uma mistura que
mexe comigo.
-Puxa vida Maria Estela, é vero... por onde te tens
andado? Que tem feito?
-Me fudendo Fabiano... tenho me fudido a rodo.
Adorei a linguagem. Lembro que Estela, era muito cheia de
pudores em tudo. Quando tínhamos por volta de vinte anos, ela se vangloriava de
ser virgem como a Sandi. Porem a virgindade dela era uma farsa. A buceta ela
não dava, mas o resto... e tudo com muito pudor. Não falava palavrões,
frequentava a igreja e vivia em um mundinho feito de ilusão. Muitos sonhos e
poucas realidades, parecia levitar a um metro do chão. De certa forma eu a
achava ridícula, como acho até hoje pessoas excessivamente sonhadoras. Sonhos
são Bambi na floresta encantada, e a realidade é um javali comendo lavagem em
um coxo imundo.
-Mas não diga isso Estela... na verdade todo mundo se
fode na vida. Ninguém passa na vida ileso...
Ela me encara como cara enigmática. Como algo não caísse
bem. Maria Estela esta transtornada. Fisicamente estava bem. Loirinha, peitos
bons, não tinha muita bunda, lábios finos cabelos levemente cacheados... tenho
certeza que você iria se agradar dela, seja homem ou mulher.
-É Fabiano... mas eu me ferrei cara... me ferrei bonito!
-Então relaxa Estale relaxa.
Nisso um cara de violão decidiu tocar algo... mas o filho
da puta era horrível. Não era musico, mas talvez quisesse ser. Eis o sonho e a
realidade de novo. O cara assassinou Chico Buarque... e recebeu alguma vaias.
Fiquei olhando para Estela... e sem dar muita ideia:
-Estela, vamos sair daqui... barulho demais... vamos
conversar la fora... no carro...
-Tudo bem, deixa eu ir no banheiro da uma calibrada no
nariz... e vamos pra onde tu quiseres...
-Tais sozinha?
-Vim com uma amiga... mas ela se arranjou com outra
mulher ali... agora estou sozinha...
-OK.
A noite começava bem.
Estela foi no banheiro, olhei a bunda dela, ela vestia
uma calça justa. Toco no meu pau, ele parece animado. Ela volta em alguns
minutos e então saímos de lá. Gente demais me sufoca. Agora dentro do kadett, Estela
se senta e fica calada, olhando o vazio. Pensei: essa puta se chapou
demais...agora fudeu... talvez eu em seja um cavalinho de carrossel?? Me
ferrei.
-Ei Estela? Tudo bem?
Silencio.
-Estela? Taís ai? Cambio... Terra para Estela!!
Então como uma bomba feita emoções, ela explode num choro
convulsivo, lagrimas viscerais rompendo com tudo. Não sou de sentir nada, mas
aquilo me causou uma dor. Um choro sentido. Fiquei olhando a pintura dela se
desfazendo mais. Eis o lado estranho da vida, ela estava triste e bonita ao
mesmo tempo. Talvez por eu gostar tanto da realidade... quando vejo coisas
reais, isso me encanta e fascina.
A abracei lentamente, encostando a sua cabeça em meu
ombro:
-Calma... calma...calma...tudo vai ficar bem...
Ela estava convulsiva. Fiquei fazendo uma contenção. Mas
senti que um abismo havia se aberto em algum lugar nela.
Porque eu?
Eu que sou um fudido, que não consigo lidar direito com
minhas próprias feridas, eu sou por vezes um fantasma de mim mesmo. Tudo bem,
tudo bem.
Aquilo dura um tempo, então Estela consegue se recuperar.
Afasta-se e me olha nos olhos:
-Fabiano eu preciso te falar algo... eu não aguento
mais...
-Fala Estela... fala de boa, sabes que sou um sujeito
desarmado...
-Minha vida tá uma merda cara...
-OK...mas que foi?
Estávamos parados ainda diante do bar lotado.
Uma briga havia começado... mulheres faziam um pequeno
show de horror, com tapas e puxões de cabelo. Gosto de briga de mulher.
Estela ficou olhando aquilo...
Segue.
Luís Fabiano.
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