O Retorno de Sebastian
Por vezes a vida é feita de detalhes. Acontecimentos
grandiosos passam despercebidos, como um raio que cai por ai, que talvez faça
diferença apenas para quem sucumbe a ele. Super-acontecimentos normalmente não
em chamam a atenção, sou discreto, frio e quase insensível a muitas coisas.
Foi o jeito que aprendi a viver, gosto deste estilo e não
nego que por muitas vezes, alguém faz o tigre sair de sua toca, alguém que
instigue a fúria, garras e unhas e que torne possível a possibilidade de
exercer o que é selvageria em mim... Gosto disto, e lamento por quem provoca
isso. Muito embora isso esteja acontecendo em uma frequência bem menor. Talvez
a idade, talvez. Ficar mais velho é ter peles caídas, cabelos brancos, olhos
sem brilho, ficar broxa e claro esperar a morte.
Nestes dias que se passaram, trabalhei bem mais que o
comum dos dias, num período de praticamente três turnos diários. Trabalho é
trabalho, e por muitos momentos era levado a reflexões. Com a mente estamos
livres, podemos estar onde quisermos... Na praia, vendo boas bundas, a lagoa
tranquila, o sol... Foda-se a o mundo, isto é muito bom.
Mas me deixem regredir um pouco.
Na noite anterior desta sexta-feira que passou, eu tive
um sonho louco: eu estava no Barro Duro ( uma praia primitiva local), era alta
madrugada, a noite mergulhada em estrelas e não havia luar. Sentei-me a beira
da lagoa e fiquei olhando o silencio, num misto de paz e temor... Temor por
tudo, mas lembro que o futuro me deixou inquieto. ( somente em sonho me
inquieto com o futuro, não creio em futuro algum, creio no agora). Então
comecei a ouvir algo se mexendo na agua... Algo que parecia se aproximar
lentamente, como se um peixe tivesse nadando sobre a agua ou... Da escuridão
mais profunda alguém vinha... alguém?! Alguém caminhando sobre as aguas? Naturalmente
como vocês eu também pensei: é Jesus? Não pode ser! Aquele cara barbudo vindo,
se aproximou de mim, não disse uma única palavra apenas me olhou... Sorriu e
seguiu seu caminho sobre as aguas... Acordei com o despertador me chamando ao
trabalho. Esqueci-me desta besteira.
Meus sonhos nunca tem sentido algum, e prefiro que seja
assim. Fui trabalhar e deixei isso pra trás. Era o que me faltava, insights
religiosos agora? Prefiro a embriagues consciente ao devaneio místico, que
fazem os anjos se apiedarem da humanidade e sua miséria...
O dia transcorreu modorrento, eu no piloto automático, em
função de tantas atividades. Você sabe como é isso? Mandam você fazer... E você
faz, como uma maquina eficiente, sem questionar, sem pensar, sem sequer estar
presente, você liga a maquina e ela funciona bem como uma batedeira.
A noite chega, o período que mais gosto. Noite profunda, a
noite parece que a vida é melhor, as coisas se tornam extremas ou mais terríveis
ou serenas, o dia traz o meio terno de tudo. Não gosto de meio termo, gosto de
tudo ou nada, vida ou morte, sobriedade plena ou embriagues eterna. Sentia-me
tranquilo. Olhava a janela de minha sala, a rua parecia bela, como uma mulher
pelada generosa, abrindo a xoxota e dizendo: vem amor, faz tudo o que tu
quiseres, me come, me chupa e lambe... vem eu sou tua hoje e sempre...
Sorri sozinho em meio a tais pensamentos. Então alguém me
interrompe, arrancando dos meus devaneios:
-Fabiano? O Fabiano... Tem um cara lá fora que quer falar
contigo urgente...
-Diz pra ele entrar...
-Ele disse que não, prefere que tu vás lá... um tipo
estranho viu...
Fiquei meio receoso. Que merda será essa? Sempre penso
que pode ser um amante ciumento de alguma mulher que deu com a língua nos dentes...
bem, nunca se sabe. Fui atender esperando um tiro.
Vou até a porta, quando abro, me deparo com uma surpresa,
que sorria a todos os dentes:
-Sebastian? És tu?
-Fabiano... Tu sabes, o bom filho a casa torna... (rindo)
Sebastian é um grande amigo. Da ultima vez que falamos,
ele anunciou que estava indo embora, para uma viagem longa, segundo ele, pelo
mundo a fora. Não acreditei nele, em Sebastian tudo é muito impreciso. Ele
deveria ser meu irmão. Porque a despedida dele, foi algo como: Até mais Fabiano,
nos falamos em breve. Este breve agora se resumia a mais de um ano. Você sabe
que é ficar sem um grande amigo?
-Cara por onde tu andaste? Que tu fizeste cara, e essa
barba e cabelo comprido? Tais parecendo Jesus Cristo... Ou fundaste alguma
religião nova?
-Estive na terra dele... Mas nem assim me convenci... Eu
sou Sebastian... o explorador dos mundos...estou de volta, esta Pelotas
continua a mesma coisa hein, que bom... Voltei para incendiar as noites e
amordaçar os dias... Voltei porque tenho amigos aqui Fabiano, coisas raras que
não se tem por aí... O mundo é uma selva quando se é estranho...
-Seja bem-vindo cara... Tu estas em casa... E eu estou
trabalhando... Esta aparição assim não exatamente o teu estilo Sebastian... Mas...
-Salamaleico Fabiano...
-Que porra é essa cara? Virou muçulmano ou islâmico?
-Sou Multi-religioso... E multi-pecador também, sou rabo
do demônio e asas de Rafael Arcanjo...
-Certo Sebastian, então me diz... Onde vamos beber hoje?
Isso merece uma comemoração... afinal..
-Não, hoje não posso, preciso pagar uma divida de sangue...
Mas estou de volta... Falando nisso, recebeste o meu recado ontem, não é??
-Ãh? Que recado? Ninguém me deu recado algum...
-Tu és de uma sensibilidade tosca hein Fabiano? A vida é
sentida cara, é preciso perceber... O sonho, eu caminhando nas aguas, lembra?
Fiquei em silencio por um instante. Não entendi
exatamente o que isso significava. Sebastian me abraça e diz:
-Farei contato... Me aguarde brother... E não fique
olhando muito pra lagoa...
-OK Sebastian... vai em paz...
-Certamente brother...
Que merda, que isso significava?
Sebastian estava indo novamente? Voltaria? Não tem como
saber, como milhares de coisas que não sabemos exatamente. A vida a morte,
quando o infarto vai acontecer, quando tudo vai dar certo?
Voltei a trabalhar, mas falar com o ele me fez bem.
Sebastian é sempre uma surpresa grata, e duvido muito que tenha se modificado,
duvido que não me coloque mais em frias... Tornei a olhar noite pela janela a
noite estava linda mesmo...
Luís Fabiano.
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