O Rei das Bucetas – Vídeo, ciúmes e um pouco de mijo
Existem criaturas que simplesmente não se importam. Não
se importam com nada, com o amanha, com as misérias do mundo, com a piroca que
não sobe mais, com a xoxota que não molha, se conseguirão sobreviver amanha.
Não se importam.
Não sei se estou me tornando assim. Talvez, não descarto
tal possibilidade. As coisas mudam , as pessoas mudam algumas vezes. Eu acho
isso importante mudar, nem que seja para pior... Jamais se ancorar por ser fácil
e cômodo... Enquanto há desafio, estamos vivos.
Vinha com esta ideia há horas que entrevistar o Rei da
Bucetas. Não pense vocês que este ícone oculto da cidade de Pelotas, enfiado no
interior do Bairro Navegantes não atraiu a câmera do Fio da Navalha.
A algumas noites atrás estive lá no bar dele, fui ver a Jussara.
A Jussara que tem fãs, ou melhor, anti-fãs por parte de muitas mulheres que
conheço. Sabe-se lá como as coisas iriam se dar. Partimos do pressuposto que
temos o não, o resto sempre é lucro. Por vezes isso, nada a perder. Eu vivo com
o sentido alerta, em outras palavras, pronto para perder tudo. É mais fácil assim.
É uma luta de boxe, se você sabe perfeitamente que um soco no queixo vai te
apagar, é melhor você já esperar por ele. Sem dor, sem emoção, o inesperado
fracasso não me assusta, ele esta no script da vida, assim como você que esta
lendo agora, e talvez não leia nunca mais... Você também faz parte.
Comecei a beber rum em casa. Uma dose caprichada, capaz
de chapar os anjos do céu e fazer os demônios se cagarem de felicidade. Pensei em
vestir meu kit de malandragem. Ganhei um chapéu branco, algumas correntes para
o braço e pescoço, ficou faltando o sapato branco? Porra Fabiano, vais ficar
parecendo um bicheiro da antiga? Esqueci a ideia. Estava de cueca no AP, fui
ate janela levando o copo. Noite fantástica está, quente, estrelada, uma
promessa feita de nada e os carros lá embaixo, vagalumes de aço indo e vindo,
todos vivendo ou tentando sobreviver. É bom ficar assim, o voyeur .
Fui ate o banheiro dar uma mijada. Lembrei de Jussara, e
o pau deu uma crescidinha na mão, sacudi um pouco e ele ficou a vontade.
Abandonei a idade de me vestir de malandro e coloquei as bermudas e sandálias e
uma camiseta de sempre. Eu sou o que sou e nada mais.
Subo no Kadett e destino ao Navegantes. Com as minhas férias,
nunca fui ao Bar do Rei na quarta-feira, a vida precisa ser uma surpresa. Chego
lá, olho as horas, são meia noite e sete. Tremendo horário.
As coisas estão animadas, apenas o pessoal das redondezas
esta pelo bar, o que é muito bom. Escuto um cavaquinho, um Tam-Tam e um
pandeiro, e a voz rouca do cantor cantando Agepê a musica Me Leva. Porra, na
hora lembrei de meu pai. Musica da antiga, esta musica fez parte de minha infância,
vendo meu pai lavar o carro no sábado à tardinha na frente de casa, e no toca
discos, Agepê fazia a festa. Lembro que eu ficava algo irritado com a musica,
porque era repetida inúmeras vezes... Achava uma merda, mas ficava na volta do
velho. Aquela lembrança me atingiu com um gancho afiado na quina da alma.
Pensei: to ficando velho eu acho... Me emocionando com qualquer coisa. Puta
merda...
Fiquei encostado no carro pelo lado de fora sorvendo
lembranças, Agepê é foda, estará vivo ou morto? A musica termina e entro no
bar. Algumas mulheres lá, estão rebolando suas saias puídas, felizes parecem,
tem uma mesa de plástico livre, cumprimento as pessoas, alguns me conhecem
outros conhecem a Jussara. Um cara fica me olhando com cara de mau. Pergunto
para o atendente do bar, que me pergunta do balcão:
-E ai Fabiano... Que vai ser?
-Quero uísque vinte e quatro anos... Com duas pedras de
gelo...
O cara cai na risada, uma risada pra lá de irônica quase
malévola.
-Tudo bem, é pra já – responde.
Então ele vem com um copo de massa de tomate, cheio até
em cima com cachaça da casa. Eu olho pra ele:
-É vinte e quatro anos?
-Não, faz vinte e quatro minutos que abri esta garrafa...
Mas já tá terminando... ( e gargalha e filho da puta)
-Tudo bem... Deixa assim, mas me diz Tomaz, cadê o Rei?
-O Rei esta atendendo... Sabes como é... Se ele fosse um pai
de santo não atenderia tanto, mas como Rei as Bucetas... Ele é foda...
-To ligado... Sempre assim... E a Jú?
-I cara... Essa daí anda triste que é a vida... O Rei
disse que é amor, amor recolhido...
Então o cara estranho que me olhava com um olhar mal
encarado, saiu de onde estava, e parecia um orangotango bêbedo, um míssil de merdas
atingindo a roupa do varal, chegou bem pertinho de mim... podia sentir o seu hálito:
-Cara que tu queres o a Jussara?
Não sou de assustar fácil. Por vezes finjo que me
assusto, finjo estou irritado, finjo que estou sofrendo... finjo qualquer merda
se isso for evitar o pior, aprendi isso com Sun Tzu, a arte da guerra, diz Sun
Tzu: Não se vence um inimigo pela força, mas pela estratégia e inteligência.
Quem faz tanta merda como eu, tem que se virar com alguma coisa. Mas não gostei
daquela intimada:
-Sou apenas amigo dela... Ela é bacana...tudo bem?
-Bacana como? Não to te entendendo negão? Qual é a tua?
-Calma brother... Calma... Pra que toda essa pressão toda?
-A Jussara é minha mulé cara, ela é minha... Te liga... E
tem outra vaza daqui... e já...a Jussara não quer nada contigo... Tu é o merda
que faz mal pra ela...
-A Jussara não é casada... E além do mais, não vim falar
com ela... meu negocio é com o Rei...
-O Rei também não vai falar contigo... vaza tchê...
O puto disse isso e virou a cachaça toda sobre mim... Avaliei
se dava uma porrada, ou ia embora talvez fosse mais sensato... O cara era grande...
acostumado com serviço de pedreiro...se eu não acertasse a primeira...tava
fudido...
O gorila pega meu pescoço, lembrei dos meus óculos... A
coisa tava ficando feia... Então como um momento mais que certo... O gongo soa...
e a voz do Rei se faz ouvir no bar.
-Mas que merda é essa que ta acontecendo aqui? Porra... O
Zidane... Larga o cara... agora...
-Qual é Rei... Esse merda, é o cara que faz mal pra
Jussara! Deixa eu dar um jeito nele... E já era... ela vai ficar feliz...
-Já falei uma vez Zidane... Solta o cara... e outra... O
coração de mulher é um mistério... Se o coração dela escolheu ele... Tu não
tens poder algum em mudar isso... Jamais serás ele... Não se muda um coração de
uma mulher, apenas ela pode fazer isso.
O cara me solta a contra gosto, caio sobre a cadeira,
estou fedendo a cachaça. Salvo pelo gongo... A merda da Jussara já estava
arrastando a buceta para outro cara por ai... É isso que eu chamo de amor...
O Rei me pergunta:
-Tudo bem Fabiano?
-Tudo...
-Seguinte Zidane... Vai embora pra tua casa... E mais... chega
de confusão aqui... Não precisas aparecer por aqui por uns quinze dias aí...
-O Rei pra que isso? Esse puto não vale nada isso...
-Isso é comigo. Não é por ele... É pela confusão... Meu
local é de respeito... A gente não caga onde come rapá!!
O cara vai saindo do bar. E o Rei se senta-se a mesa
comigo. Tem um sorriso largo na boca, dentes muito alvos... e parece relaxado:
-Te salvei em filho? O puto ia se servir em ti... Ele é
bom de porrada...
-A vida não é fácil Rei. Mas eu to ficando velho, e tu sabes...
o demônio é a idade...
-Vais virar vinho ou vinagre?
-Não sei... Não tenho planos nem pra uma coisa ou
outra...
-É... sábio isso... Mas o que te traz aqui? A Jussara?
Ela é fantástica não é?
-A Jussara também... Mas a real Rei... quero te botar a
falar diante da câmera? Tá ligado? Um papo de bar... de preferencia aqui
mesmo... Tu falando as tuas coisas... a maneira filosófica como conduzes a
vida...
Ele me olha com gravidade... Permanece em silencio por
algum tempo... Um tempo que me pareceu longo demais... Então rompe o silencio ao
mesmo tempo em que o samba volta a ser tocado:
-Filho... Não vou poder atender nisso. Não gosto de câmera,
não gosto de publicidade. Eu sou apenas um Rei, em seu humilde reinado, gosto
de ver quem me vê ou fala comigo, gosto de olhos nos olhos. Gosto da coisa
humana, que nenhuma tela pode dar... Além do mais isso atrai curiosos... E eu
não me importo com curiosos. Agradeço o convite...
-Mas tu sabes que eu escrevo a respeito de ti, no Fio,
não é?
-Sei... Claro que sei, as gurias me mostram na
internet... Mas a escrita filho, deixa a mente voar mais alto... na cabeça das
pessoas...o Rei das Bucetas tem sua versão... E cada uma delas tem seu Rei das
Bucetas... Eu jamais quebraria isso. Sou o Rei das Bucetas delas... ( começa a
rir).
-OK Rei... Este é um não definitivo?
-É um não... Apenas.
-Vamos beber?
Ele faz um sinal para o cara que atende, e em segundos vêm
dois copos grandes de cachaça... Duas pedras de gelo... o cara me olha e diz:
-Esse teu agora é 34... Minutos... há, há...
Eu brindo com o Rei. O bar estava agora mais vazio, as
meninas ainda estavam por ali... E sorriam para Rei. Ele aponta o colo e uma
dela vem sentar no colo dele.
-Rei - pergunto eu – e a Jussara?
-Fabiano... Fabiano...tu faz mal pra aquela mulher...tuas
longas ausências ferem ela... Ela
entende como indiferença, falta de amor... essas coisas...
-A culpa é minha?
-Em parte sim... Tu és como és... E o amor dela... ainda
é frágil, isso gera sofrimento...um amor fraco teme ser destruído, um amor
fraco...teme o ciúme, teme a tudo e a todos a sua volta inclusive ser
abandonado.
-E como tem que ser um amor verdadeiro?
Ele respirou fundo e sorriu:
-Este amor tem que cruzar uma tempestade, um deserto e a
geleira... E ainda sim estar abraçado em ti. Se passar por tudo isso... ela te
ama...se não...não é nada não, é a vala comum onde a grande maioria das está.
Fiquei refletindo. O amor ou os amores, sempre foram
coisas que me perturbaram, e creio que até a hoje não sei lidar direito com
isso. O Rei falou isso me olhando nos olhos.
Estava cansado, achei melhor ir embora. Mas antes matei o
copo de cachaça. Despedi-me do Rei... mas antes de ir embora eu resolvi dar uma
passada na casa de Jussara? Boa ideia? Não sei.
Estaciono o carro na frente da casa dela. Esta tudo
apagado, não esta em casa ou dorme. Bato na porta:
-Ju... Ju...tu estas aí? É o Fabiano...
Ouço o barulho dentro do chalé. Ela esta... Mas parece
que não me quer por ali... eu bato novamente, então ela grita:
-Vai embora Fabiano... vai embora...seu filho da puta de
merda...vai embora... E não aparece mais aqui...
-Que isso Jussara, porque essa agressividade? Que foi que
eu fiz?
-Vai embora... Tu não faz nada, alias tu nunca faz nada...
não te quero mais...vai embora...
Ela fazia aquela voz que não traduzia certeza alguma. Reconheço
o tom com facilidade, iria insistir mais até...
-O Jussara...vamos conversar...
Então... subitamente a porta do barraco abre... E Jussara
surge, desarrumada, cabelos desgrenhados, de camiseta e calcinha mínima... E
com uma faca enorme de açougueiro na mão... Veio pra cima...
-Já disse vaza... Já eras Fabiano... já eras...
Recuei, a faca era grande... e estava apontada para meu
culhões. Sei que não era um bom momento para reflexões... Mas pensei depois,
que ser morto a facadas por uma bela mulher é uma maneira de morrer... A outra
é seria morrer trepando... O teu ultimo ato da existência é uma gozada mortal,
que me arrebata deste mundo e te jogo nos braços de Deus ou do outro?
Ela estava me encarando com aquele olhar doentio, que
somente os loucos olham.
-Tudo bem Jussara... Eu vou... mas eu volto... Um dia.
-Se tu voltares eu te mato ou capo... Tu não és um ser
humano.
-Mas quem tá armado, não sou eu...
Subi no Kadett, e tudo estava em ordem. Então ela chega à
parte da frente do carro... Fica me olhando... vira de costas e arreda a
calcinha para o lado... E aponta a xoxota para o capo... e da uma longa mijada
no capo do carro... seguido de um peido sonoro... Termina de mijar e volta pra
dentro de casa.
Não sei exatamente o que aquilo significava... Talvez
como um animal, ela quisesse marcar seu território? Não sei. Estava cansado
aquilo, ciúmes, cachaça, peido e mijo... noitinha agitada.
Hoje sem xoxota de Jussara... Sem fodas monumentais ou
paisagens colossais, ou gritos de desespero num mergulho interminável, de
loucura no abismo, é hoje não vai rolar... Tem dias que a noite é foda.
Luís Fabiano.
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