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quinta-feira, agosto 02, 2012




Noite Difícil

As coisas não estavam dando nada certo naquele dia. Sabe quando se tem a impressão que o mundo esta conspirando contra você? Os malditos anjos filhos da puta, estão de férias nestes momentos? Que merda é essa? Provações carmicas? Ok. Aí não tem o que fazer, você vai sendo empurrado lentamente contra o beco... É lutar nos ventos inúteis ou aceitar ser patrolado pelo mundo todo.

Naturalmente isso vai nos tornando mais irritadiços. Eu estava. Era precisava procurar uma vitima para explodir minha raiva, o bode expiatório, que não fosse muito forte. Naquela época eu tinha uma péssima maneira de lidar com as pessoas e a com a vida.

Hoje aprendi a relaxar mais. Fui me tornando um saco de pancada  mais sereno. Bata a vontade “compadre”, uma hora você, cansa e eu venço.
Charlote estava se tornando insuportável. Todos os dias inventava um problema, ela tinha uma relação instável com um. A principio aceitava meu estilo, mas depois de um tempo, eu não me tornei domesticável, e as coisas começaram a fuder.

Eu saia toda sexta-feira, coisas que faço ainda hoje. Sair para beber, conhecer novas vagabundas, observar a vida onde a vida acontece. Não se iluda. O trabalho é para nos dar a grana, o lar para nos suportar. Nestes lugares a vida não acontece, você vive para se tornar parte da maquina, você é uma peça desimportante, junto com tantas outras que formam um suposto ideal importante. A maquina imitando a natureza não dá bola, se você esta bem ou não, se sua casa foi levada pela enchente, queixe-se para Deus se quiser...

Meus vícios, minha loucura, minha incapacidade de ser previsível detonavam, lentamente as expectativas de Charlote, eu sabia. No fundo eu não me importava. Não era o amor de minha vida. Hoje acho estou um pouco mais humano.

Até levo algumas pessoas em consideração. Evolução? Talvez.
Naquela sexta-feira, nem fui em casa. Cai na noite tranquilo. Minhas tocas de sempre, Bar do Sujeira, Pássaro Azul, o samba no Navegantes e o grande Rei das Bucetas, amigo e mestre das horas noturnas. O bar do Sujeira foi a pedida, é minha segunda casa.

Os personagens decadentes de lá, são como perolas incrustradas no lixo. O brilho fantástico de uma pobreza incandescente, ostentando a beleza do nada. A fera a procura de paz, o sorriso em meio tom, e a alma descerrando uma nascente viva.

Chego ao bar do Sujeira. Seu mau humor eterno, rosnado de pittbul. Não me assusta. O bar cheio. A catedral não lota nas missas, logo o Sujeira é o pastor dos “melhores”.

-E ai Sujeira? Tem aquele de sempre?
-Rrrrrhhh, rum? Claro idiota, é só tu que tomas esta merda aqui...
-É Sujeira, eu também tô feliz. Valeu, serve ai.
Sento a mesa, a porra do celular acende como uma vela do inferno. É Charlote, fico pensando se atendo ou não? Peguei uma moeda e deixei o telefone tocando, cara eu atendia, se coroa, não. Jogo a merda da moeda, deu cara. Dia que você perde pra você mesmo é pra fuder.
-Boa noite Charlote – atendendo ao telefone.
-Boa noite? Fabiano, onde tu estas? Tu deve tá bebendo né? Diz, pode dizer... Diz... Onde...
-To bebendo sim, quer um gole?
-Olha Fabiano, se tu não vier agora pra casa... tu não precisa mais vir.
Comecei a rir. Então a vida não é perfeita?
-Charlote, não diz coisas sem pensar... Sabes como é, os desejos podem acontecer...
-Tens meia hora pra chegar... Meia hora... Tchau.

Bateu o telefone com violência. Certamente ela queria acertar a minha cabeça. Nem cogitei em ir pra casa. Já deixei gente por aí, por muito menos que isso. Ela que fizesse o que quisesse. Tinha fome de vida, viver como se fosse o meu ultimo dia de tudo. O Sujeira trouxe meu rum. Bebi com gosto aquilo, como se tivesse chupando a melhor buceta do mundo. Rum de péssima qualidade, parecia óleo diesel, mas naquela hora sombria foi.
Então como um capitão no comando de meu navio, decidi dar outro rumo a minha noite.

Todo bar, seja ele qual for, sempre tem alguém que quer comer você, ou que você quer comer. Todos. Minha experiência neste sentido é boa. Quanto a qualidade do que se vai comer... Bem, foda-se.

Meus olhos começaram a passear pelo ambiente. Nada. Porque haveria, né? Nem as velhas putas quebradas de sempre, que trepam por uma cerveja barata... Se eu quisesse mudar a coisa, teria de partir para outro lugar, estava com preguiça.

Lembrei-me de Jaqueline no bar do Rei das Bucetas, lá no Navegantes. Ela é 
muito parecida com uma ancora. Uma mulher grande, morena, cabelos lisos e negros como a noite, sorridente e bebedora, que disse numa noite de muito álcool, algo assim: Fabiano... Sou tua, quando tu quiser cara... Este material aqui, é todo teu, tá ?(disse isso alisando o corpo farto).

Eu nunca dei bola pra aparência. Magra, gorda, negra, branca, faltando dentes, bafuda, com hemorroidas arrombadas... Isso é besteira de fresco. Eu procuro o desejo dela, e o querer bem. Ela me queria bem. Eu acho. Terminei meu rum, e sai do enevoado bar do Sujeira, em direção ao Navegantes. O kadett desliza por uma Pelotas em chamas, todos estão nas ruas, a procura de diversão, do sentido, de achar-se e perder-se.

Chego ao bar Navegantes. As felizes portas abertas, o samba de raiz, anima a vida. O mestre não estava lá, devia estar dando um trato em alguma moça por ai, afinal o cara é o Rei das Bucetas. Lá, opção de bebida é cerveja, aquela que é ruim sabe... Ou então cachaça. O rum tinha feito o seu trabalho, eu estava um pouco melhor. Sentei a mesa e pedi a cerveja. Onde estaria Jaqueline?

Dei um tempo. No celular 57 chamadas não atendias de Charlote. Então, Jaqueline aparece, tava acompanhada de um cara enorme. Fiquei na minha, apenas olhei pra ela. O cara foi no banheiro e ela veio sorrateira:

-Oi Fabiano... E ai ?
-E ai digo eu, é hoje o nosso dia?
-Bem, não sei se vai dar... To ficando com o cara ali... ta ligado...
-Dispensa ele... E vamos beber algo por ai... eu mais tu...
-Cara, hoje não dá... Desculpa ai...
O cara voltou e viu ela conversando comigo, veio até a mesa.
-Qual é Jaque, este cara aí? Qual e a dele...
-Calmo meu irmão... Tá tudo bem... Tava apenas conversando com a donzela aí... Já to de saída brother...
-É meu irmão, já sai saindo viu... vasa... Cara...

Eu já levei porrada na cara, não é das melhores sensações. Eu não tava afim e não tinha condições de brigar.
E agora?O que eu faria? Quem sabe eu pedisse desculpas para Charlote? Não, o orgulho é uma merda...

Entrei no carro, não queria procurar mais ninguém. Levei o carro para avenida Bento e estacionei num posto de gasolina... Aquela seria uma tentativa de uma noite de sono. Boa noite.

Luís Fabiano.

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